História

Os Árabes e o Islamismo

O Islamismo surgiu em 630, quando Maomé se apoderou de Meca, afastou os Coraixitas do poder e destruiu os ídolos da Caaba. De 630 até 660, o Islamismo foi dirigido pelos familiares de Maomé, os Haxemitas. De 660 até 750, a dinastia Omíada esteve no poder. Os Abássidas começaram a dirigir o Islamismo em 750, quando na Espanha já surgia o primeiro califado autônomo, instaurado por descendentes dos Omíadas.

Na África do Norte surgiu também um califado por volta do ano 800, tendo Kairuan (na Tunísia) como capital. Os descendentes de Fátima, única filha do profeta Maomé, conquistaram o Egito e fundaram a cidade do Cairo, em 969. Nesse momento, o Império Islâmico original estava reduzido ao Oriente Médio, com a capital instalada em Bagdá. Esta foi tomada pelos mongóis, no século XIII (1258). Caberia aos turcos otomanos restaurar o Califado do Oriente e estabelecer sua sede em Constantinopla, conquistada em 1453 pelo sultão Maomé II.

A Arábia Pré-islâmica ou Pré-islamismo

A Arábia é uma península da Ásia Ocidental, próxima da África. Limita-se a noroeste com a Palestina, ao sul com o oceano Índico, a leste com o golfo Pérsico e a oeste com o mar Vermelho.

Os Árabes e o Islamismo

O litoral do mar Vermelho é a região que apresenta melhores condições geográficas, permitindo até mesmo uma razoável prática da agricultura, se bem que em áreas restritas. É ali que se localizam antigas cidades como Meca e Medina (anteriormente, Iatreb). Esses núcleos urbanos eram importantes centros comerciais, de onde partiam caravanas em direção a Aden, no sul da Arábia, ou a Bassorah, no golfo Pérsico. Nos referidos portos, os mercadores adquiriam especiarias orientais, que ali chegavam através da navegação de cabotagem, e as revendiam no Oriente Médio e Próximo. Os lucros eram enormes e fizeram a fortuna dos comerciantes, principalmente de Meca.

Além do comércio externo, havia um ativo comércio interno entre os árabes do deserto, conhecidos como beduínos, e os do litoral. As práticas comerciais, contudo, circunscreviam-se aos meses finais do ano (setembro a dezembro), quando os beduínos se deslocavam em direção às cidades.

Além de seus objetivos mercantis, essa migração possuía também um caráter religioso, tendo Meca como ponto de convergência. A atração da cidade era um templo, a célebre Caaba, que abrigava numerosos ídolos adorados pelas tribos do deserto, assim como uma Pedra Negra, sobre a qual, segundo a tradição, repousou Ismael, considerado o ancestral do povo árabe. Havia ainda em Meca uma fonte sagrada (Zem-Zem), um vale onde o demônio (Iblis) era apedrejado pelos fiéis e o Monte Arafat, local de meditação noturna.

Os beduínos preferiam Meca a Iatreb porque a visita lhes dava satisfação espiritual e material, devido ao comércio das feiras. Por isso mesmo, existia entre as duas cidades uma rivalidade que era simultaneamente comercial e religiosa.

Maomé e o Islamismo

Maomé nasceu em Meca, por volta do ano 570, e pertencia à tribo que dominava a cidade: os Coraixitas. No entanto, era de uma família pobre, os Hexemitas. Ficou órfão aos seis anos de idade, sendo criado pelo avô e em seguida pelo tio Abu Taleb.

Aos 15 anos de idade, já trabalhava nas caravanas que demandavam a Palestina e a Síria. Foi assim que tomou contato com povos e regiões diferentes e conheceu novas religiões, principalmente o cristianismo e o judaísmo. Assimilando os ensinamentos dessas duas doutrinas monoteístas, construiu um sincretismo religioso, isto é, uma integração de elementos retirados do cristianismo, do judaísmo e do paganismo árabe.

Porém, a vida atribulada de Maomé não lhe permitia estruturar seu sistema religioso. Daí a importância de seu casamento com Khadidja, uma rica viúva que lhe proporcionou a estabilidade material necessária para seu desenvolvimento intelectual. Maomé começou a fazer retiros espirituais no Monte Arafat, até que no ano 610 teve “três visões” do anjo Gabriel. Na última, o anjo ter-lhe-ia dito: “Maomé, tu és o único profeta do verdadeiro Deus (Alá)!” A missão de Maomé estava implícita nessas palavras.

Principiava agora a etapa mais difícil da vida do Profeta: a difusão da crença. De início, restringiu suas pregações aos familiares e amigos, tendo em dois anos feito mais ou menos 80 adeptos. Sentindo-se mais seguro, iniciou a pregação pública aos Coraixitas, de quem naturalmente adviria a maior oposição, visto que estavam ligados economicamente ao politeísmo vigente na Arábia.

De início, os Coraixitas se surpreenderam com as revelações de Maomé, segundo as quais só havia um Deus, de quem ele, Maomé, era o Profeta. Depois, procuraram ridicularizá-lo. Por fim, começou a perseguição. Uma tentativa de assassinato ocorreu em 622, quando então Maomé fugiu de Meca para Iatreb. Essa foi a Héjira (“fuga”), que marca o início do calendário muçulmano.

Em Iatreb (a partir de então chamada Medina), Maomé afastou a oposição de um grupo de judeus que habitavam a cidade e se negavam a aceitar a crença em Alá. Em seguida, começou a Guerra Santa contra Meca, atacando suas caravanas, cujos itinerários conhecia muito bem. Seus êxitos militares eram considerados provas da existência de Alá.

Diante do crescente prestígio de Maomé, os Coraixitas procuraram um acordo (Tratado de Hodaibiya): Maomé voltaria para Meca, mas os ídolos da Caaba deveriam ser conservados. Mas em 630, com o apoio dos árabes do deserto, Maomé destruiu os ídolos, com exceção da Pedra Negra, que foi solenemente dedicada a Alá. Estava implantado o monoteísmo e com ele surgiu o Islamismo, o mundo dos submissos a Alá e obedientes ao seu representante, o Profeta Maomé. Organizou-se, assim, um Estado Teocrático.
De 630 até 632, quando morreu, Maomé viveu em Medina. Converteu pela força das armas os árabes recalcitrantes. Construiu a Mesquita de Kuba, em Medina, e organizou a doutrina islâmica em seus pontos essenciais. Seu livro básico, o Corão ou Alcorão, só foi compilado mais tarde, com base nos escritos de Said, um escravo persa que sintetizava seus pensamentos. A Suna, conjunto de ditos e episódios atribuídos a Maomé, surgiu depois, para completar a tradição em torno da vida do Profeta.

A doutrina islâmica prega a existência de um só Deus, com natureza exclusivamente divina, sem forma humana; daí a proibição a todos os crentes (muçulmanos) de representarem formas vivas. Maomé devia ser considerado o último e principal profeta, continuador de Moisés e Jesus, também considerados profetas. Os muçulmanos deveriam acreditar nos anjos, no Juízo Final, no Inferno e no Paraíso; estes últimos possuíam uma conotação profundamente materialista, com sofrimentos e prazeres literalmente materiais.

A moral islâmica baseava-se no cristianismo e nas tradições árabes. As principais exigências do islamismo eram: crença em Alá, cinco orações diárias, jejum no mês de Ramadã, peregrinar a Meca uma vez na vida e dar esmolas. A Guerra Santa contra os infiéis era uma prática recomendável, mas não obrigatória.

A expansão do Islamismo (séculos VII – XI)

A expansão dos árabes muçulmanos foi uma das mais fulminantes da História. Em um curto espaço de tempo, os árabes conquistaram um império mais vasto que o Império Romano em seu apogeu. Os elementos explicativos dessa rápida conquista foram: a explosão demográfica dos árabes, a atração pelo saque (botim), a centralização política e o fanatismo religioso. Além disso, deve-se considerar a fraqueza dos adversários: o Império Bizantino e o Império Persa vinham se desgastando numa luta secular; o Império Romano do Ocidente havia desaparecido; e os remos bárbaros germânicos eram demasiado fracos para conter os muçulmanos.

As primeiras conquistas foram feitas pela dinastia Haxemita, constituída pelos familiares de Maomé, sendo Meca a capital do Islamismo. Maomé unificara a Arábia em termos religiosos e seu sogro Abu Bekr (pai de Aisha), eleito seu sucessor, realizou a unificação política. Ornar, segundo califa, ampliou as conquistas, ocupando a Síria, a Palestina, a Pérsia e o Egito. Ornar pereceu assassinado pela família Omíada, que disputava o califado aos Haxemitas. Ali, marido de Fátima, filha única do Profeta, foi o último dessa dinastia. Em seguida, os Omíadas controlaram o califado e mudaram a capital para Damasco; seu primeiro califa foi Otman.

A dinastia Omíada impulsionou a expansão em direção ao Ocidente. Depois de ocuparem o norte da África, os árabes, também chamados sarracenos, invadiram a Espanha, em 711, obrigando os visigodos a recuar para a região das Astúrias. Mas os francos, chefiados por Carlos Martelo, impediram em Poitiers, em 732, que o avanço muçulmano submergisse a França. Não obstante, todo o sul do país caiu em poder dos invasores, assim como as ilhas da Córsega, Sardenha e Sicffia.

Nesse momento, em Damasco, os Omíadas eram substituídos pelos Abássidas, que transferiram a capital para Bagdá. Na Espanha, surgiu o califado independente de Córdoba. Era o início da cisão política do Islamismo, que terminaria por se desmembrar em numerosos califados autônomos e conflitantes. Mas a força dos árabes ainda subsistiria por algum tempo: tomaram Palenno, em 830; Bari, em 840; e saquearam Roma, em 846.

Assim, os muçulmanos assumiram o controle do Mediterrâneo. Só não dominaram o Adriático e o Egeu. As comunicações dos cristãos através do Mediterrâneo foram bloqueadas, obrigando-os a navegar pelo Adriático até o porto balcânico de Zara, de onde se dirigiam para Constantinopla por via terrestre, através da Macedônia.

Das posições que dominavam em terra firme, os árabes faziam incursões (razzias) contra as áreas dominadas pelos cristãos, implantando a insegurança geral. A Europa encontrava-se, assim, isolada. O restante das atividades comerciais que ainda subsistiam depois das incursões germânicas desapareceu quase completamente. Obviamente, a economia europeia ressentiu-se e a tendência à ruralização, que já era marcante desde o século V, iria agora completar-se.

Na Europa Ocidental prenunciava-se o sistema feudal; o fechamento do Mediterrâneo pelos muçulmanos é um dos fatores explicativos do surgimento desse sistema.

A cultura muçulmana medieval

A importância maior da cultura muçulmana reside em seu caráter sincrético. O extenso contato que os muçulmanos tiveram com outras civilizações proporcionou-lhes uma enorme soma de conhecimentos. Os algarismos hindus foram transferidos para o Ocidente e as obras gregas toram traduzidas para o árabe com maior precisão do que para o latim.

No campo da Química, os árabes se destacaram pela descoberta de ácidos e sais. Na Matemática, pelo desenvolvimento da Álgebra. Na Física, por várias leis da Óptica.

As artes plásticas não tiveram um desenvolvimento notável por causa da proibição religiosa de representar formas vivas. Mesmo assim, desenvolveram a Arquitetura com a utilização de arcos e cúpulas. A Pintura se limitou aos arabescos, em que as letras do alfabeto árabe adquiriam função decorativa.

A Filosofia muçulmana teve em Averróis um dos máximos representantes da filosofia medieval. Traduziu numerosas obras gregas para o árabe e comentou Platão. Aviena dedicou-se à Medicina, descobriu a natureza contagiosa da tuberculose, descreveu a pleurisia e algumas variedades de doenças nervosas. Sua principal obra, Canon, tornou-se manual básico de ensino nas universidades euro ias. Rásis, outro médico, descobriu a verdadeira natureza da varíola.

Os árabes descobriram ainda antídotos contra envenenamento perceberam os mecanismos de difusão da peste pelo contato e desenvolveram a higiene médica e hospitalar.

A literatura muçulmana tem um caráter mais imaginoso e sensual do que intelectual. No Livro dos Reis são narrados acontecimentos relativos ao Império Persa. Rubayyat, de Omar Khayyam, é um poema que reflete o modo de viver e sentir predominante na cultura persa.

Conclusões gerais

Do exposto, concluímos que a facilidade do proselitismo islâmico se explica em função do sincretismo que caracterizou a religião de Maomé. Sincretismo, aliás, adequado às necessidades materiais e espirituais dos árabes. A importância de Maomé prende-se ao fato de ter percebido a realidade árabe, adaptando-lhe uma religião na medida das necessidades impostas pela própria realidade

Em última análise, o êxito da doutrina islâmica se deve ao fato de ser ela uma espécie de teorização da realidade. Não nos cabe fazer juízos de valor sobre a atuação de Maomé; importa apenas que ele atingiu os fins perseguidos.

O Islamismo traz no próprio bojo os fatores explicativos de sua expansão. No plano material, o modo de vida típico dos árabes — sobretudo na Arábia do Deserto — constitui um dado importante: a falta de recursos, a explosão populacional, as guerras constantes entre as tribos, o nomadismo, tudo isso foi canalizado pelo Estado Teocrático como fatores impulsionadores da conquista. O interesse pelo botim é o dado econômico da expansão, assim como a miscigenação é o dado social mais importante. Em termos religiosos, as recompensas extraterrenas, a visão do Paraíso e a Guerra Santa foram, a um só tempo, fatores religiosos e psicológicos da expansão.

A conquista muçulmana foi facilitada pela fraqueza dos Impérios Persa e Bizantino, assim como pela debilidade dos Estados bárbaros que haviam sucedido ao antigo Império Romano do Ocidente. A existência de um poder político localizado, no lugar da antiga centralização imperial, beneficiou o avanço muçulmano.
Os contatos iniciais entre muçulmanos e cristãos foram quase sempre belicosos, salvo raras exceções. Esse fator, aliado à própria expansão árabe, contribuiu para a ruralização da Europa Ocidental e, no limite, para o surgimento do feudalismo, sem entretanto tê-lo determinado, pois o processo de ruralização começara muito antes.

Quando a Europa reagiu no final do século XI, dando início às Cruzadas, os móveis básicos dessa reação eram intrínsecos ao próprio Ocidente. Ligavam-se à crise do sistema feudal, que marginalizava milhares de pessoas, tornando-as disponíveis para grandes empreendimentos militares. Ainda mais, fatores de ordem política, tais como a centralização monárquica que se esboçou nesse período, deram sua contribuição. E claro que a centralização mais importante para o caso era a de nível universal, representada pelos poderes papal e imperial. No plano religioso, tanto os problemas de estrutura eclesiástica, como o Cisma do Oriente, como os problemas de fé (por exemplo, a espiritualidade exacerbada da época) explicam o processo.
Diferentemente do primeiro momento do contato, quando o Islamismo invadiu a Europa, na segunda fase os contatos entre cristãos e maometanos tiveram um caráter bem menos violento.

Esta observação pode ser confirmada no Oriente Próximo, onde se instalaram os remos cristãos durante as Cruzadas, ou nos fondacos, entrepostos onde os italianos comerciavam regularmente com os muçulmanos. Foram efetuadas trocas culturais de parte a parte, das quais os cristãos tiraram maior proveito.

Em relação ao feudalismo, podemos dizer que o relacionamento pacífico entre cristãos e muçulmanos permitiu o renascimento do comércio, da economia de mercado e das trocas monetárias, ou seja, o início do desenvolvimento do pré-capitalismo na Europa. Este fato é importante na explicação de como se deu a desintegração do modo de produção feudal; mas não constitui seu elemento fundamental, pois este é interno a próprio sistema.

Os árabes contribuíram também para o progresso científico. Suas pesquisas químicas e matemáticas lançaram as bases do desenvolvimento científico da Europa Ocidental na época do Renascimento.

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