Escultor mineiro do século XVIII, Aleijadinho não é apenas o maior nome do Barroco brasileiro, mas também um dos expoentes das artes plásticas de todo o período colonial nas Américas.
A vida de Aleijadinho
Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho, nasceu em Ouro Preto em 1730, quando a cidade ainda se chamava Vila Rica. Era filho bastardo do mestre-de-obras português Manuel Francisco Lisboa e da escrava africana da qual se sabe apenas o nome, Isabel.
Muito se escreveu sobre Aleijadinho, mas pouco se sabe com certeza sobre sua vida, pois a bibliografia é em grande parte baseada num único trabalho, Traços biográficos relativos ao finado Antônio Francisco Lisboa, de Rodrigo José Ferreira Bretãs. O livro, publicado em 1858. mais de quatro décadas após a morte de Aleijadinho, mistura fatos e mitos sobre o personagem. Até sobre a data e o local de nascimento pairam dúvidas.
É certo que por volta de 1777, quando já tinha mais de 40 anos, Aleijadinho desenvolveu uma doença degenerativa que lhe causava dores intensas e lhe deformava o corpo e as feições. Nunca se chegou a um diagnóstico exato, mas é mais provável que tivesse sido lepra.
Seja como for, segundo o relato de Bretãs, a partir daquele ano Aleijadinho, tendo perdido os dedos dos pés, não conseguia mais andar e locomovia-se de joelhos. Mais tarde, com os dedos das mãos atrofiados, teria decidido cortá-los, “servindo-se do formão com que trabalhava”. Para continuar a esculpir, pedia a seus escravos que amarrassem o cinzel e o martelo em suas mãos.
Com aspecto “asqueroso e medonho”, Aleijadinho evitava contatos sociais, dedicando-se totalmente ao trabalho, Embora tivesse escravos, ganhou pouco dinheiro. Perto do fim da vida, pobre, ficou completamente cego. Morreu em 18 de novembro de 1814, aos 84 anos.
A obra de Aleijadinho
Conhecido sobretudo como escultor, Aleijadinho foi também entalhador, desenhista e arquiteto. Cursou apenas o primário e aprendeu o oficio com o pai e o tio, Antônio Francisco Pombal, entalhador de prestígio em Vila Rica. É provável que também tenha estudado com o pintor português João Gomes Batista e o entalhador José Coelho de Noronha.
A obra de Aleijadinho não pode ser dissociada do ciclo do ouro em Minas Gerais, de intensa atividade intelectual e artística. Embora praticamente nunca tenha viajado para além das cidades mineiras, Aleijadinho tomou conhecimento da tradição barroca por meio de textos e ilustrações. Consta que teria buscado inspiração nos livros da biblioteca do poeta Cláudio Manuel da Costa, um dos líderes da Inconfidência Mineira, e em gravuras góticas e bizantinas da Bíblia.
A partir dessas informações, desenvolveu uma arte brasileira a partir de matérias-primas como a madeira ou a pedra-sabão, e não o mármore e o bronze dos artistas europeus.
Sua produção costuma ser dividida em duas fases distintas: antes e depois da doença. Mário de Andrade foi um dos primeiros a apontar a distinção. No período em que trabalhou com saúde, sua obra é marcada pela serenidade, equilíbrio e clareza.
Exemplos dessa produção são o projeto das igrejas de São Francisco de Assis, em Ouro Preto e em São João dei Rei, e a capela-mor da igreja Nossa Senhora das Mercês e Perdões, em Ouro Preto. Suas principais obras-primas datam da fase em que ele estava doente.
É nesses anos que surgem elementos góticos e expressionistas. Os dois trabalhos magistrais dessa fase são as figuras dos Passos da Paixão e os Doze Profetas.
O conjunto monumental Passos da Paixão, que data dos últimos anos do século XVIII, é composto por 66 estátuas em madeira de cedro policromada, em tamanho natural, que representam a paixão de Cristo. A obra é preservada na cidade de Congonhas, no Santuário do Bom Jesus de Matosinhos. Dessas figuras, talvez a mais conhecida seja a de Cristo carregando a cruz, em que o personagem com a coroa de espinhos é retratado com expressão de horror acentuada pela tensão dos dedos e sangue das pernas.
Quanto aos Profetas, dos primeiros cinco anos do século XIX, esculpidos em pedra-sabão para o adro da mesma igreja, são bem maiores que o tamanho natural e em total sintonia com a arquitetura.
Obras de Aleijadinho encontram-se espalhadas pelo circuito das cidades históricas de Minas, principalmente Sahara, Mariana e Tiradentes, além de Ouro Preto e Congonhas.
No século XIX, quando predominou o gosto acadêmico, sua obra foi praticamente ignorada. O maior expoente do Barroco só seria revalorizado no início do século XX.
Veja também: