História do Brasil

O Trabalhismo na Era Vargas

Após a Crise de 1929-30, o liberalismo estava em baixa no mundo. O movimento operário e a democracia social cresciam em linhas diferentes, mas em resposta a uma série de acontecimentos e a toda uma reorganização social que ocorria no mundo, ao redor da indústria. No Brasil, sob o contexto do populismo que caracterizou a Era Vargas, surgiu o trabalhismo e o movimento que levaria a uma vasta legislação sobre os direitos trabalhistas.

Por origem, a legislação sindical, ainda que existente no país, foi construída de modo a conceder aos empresários e trabalhadores a responsabilidade pela organização, negociação e gestão das relações de trabalho. O peso evidentemente parecia pender para o empresariado e a burguesia, e o populismo do governo Vargas viu nas relações operárias a ocasião perfeita para fazer história.

As associações de classe e os sindicatos, na visão do trabalhismo corporativista de Vargas, deveria ser organizados pelo Estado, que formularia as diretrizes para o engrandecimento do país, cabendo a todos colaborar nesse esforço.

A desorganização e desunião das agremiações sindicais, sob a óptica do novo trabalhismo, reduzia o poder do operário nas relações com o patronato. Cada profissão deveria ter um único sindicato. Os sindicatos eram considerados órgãos privados com funções públicas e ficavam diretamente subordinados ao governo por meio do Ministério do Trabalho.

A necessidade de mão-de-obra no contexto urbano e industrial, contudo, levaria ao “prêmio” de contrapartida para o empresariado. Os novos direitos trabalhistas apenas seriam concedidos aos trabalhadores sindicalizados, tornando a filiação algo atrativo, e somente aos trabalhadores urbanos. Com isso, o governo promovia o trabalho nas cidades e acelerava o êxodo rural, garantindo à classe industriária em crescimento mão-de-obra abundante.

Para financiar a estrutura sindical foi criado o “imposto sindical” obrigatório, que corresponde a um dia do salário anual do trabalhador, seja este sindicalizado ou não. O imposto, recolhido pelo governo e atribuído ao Ministério do Trabalho, seria repassado às organizações sindicais, garantindo a elas suporte financeiro para defender as classes que representavam. Cada sindicato, contudo, possuía um volume máximo de filiados – o que garantia, ao menos em tese, o cumprimento dos benefícios concedidos ao trabalhador por sua filiação.

Infelizmente, uma minoria privilegiada acabava por sustentar a reeleição dos dirigentes sindicais, garantindo seus benefícios. Em troca, choques com patrões e com o governo eram evitados e as entidades se mantinham estáveis e fortes. Assim, perpetuavam-se no poder e ficaram conhecidos como “pelegos”.

O corporativismo de Vargas

Cartaz de propaganda do governo Vargas fazendo alusão as leis trabalhistas.

Outra característica importante do trabalhismo de Vargas era o corporativismo, apresentando-se como alternativa ao socialismo e ao liberalismo capitalista. O corporativismo não apenas criava grupos e agremiações entre os trabalhadores, mas também entre os detentores dos meios de produção. Associações setoriais e sindicatos patronais eram organizados em conjunto com sindicatos de trabalhadores, e ambos recebiam a supervisão do Estado. Em tese, o objetivo era reduzir a desigualdade social eliminando o conflito de classes.

O corporativismo promoveria a harmonia social, o progresso, o desenvolvimento e a paz. Esse modelo, inspirado no fascismo italiano, transformou os sindicatos em órgãos de colaboração de classe, visando evitar os conflitos entre patrões e empregados.

O trabalhador recebia direitos em troca de “disciplina” ou “participação”, e era doutrinado a atender às metas fixadas pelo governo e pelas associações patronais, e em troca era premiado com direitos e benefícios garantidos pelos seus próprios sindicatos – sem ações grevistas ou reivindicatórias.

Para mediar toda a estrutura do trabalho, Getúlio criou a Justiça do Trabalho, um fórum especial em que patrões e empregados resolveriam suas pendências trabalhistas, individuais ou coletivas, sob a luz de uma vasta legislação trabalhista e sindical de apoio. A principal função do foro trabalhista era o de evitar choques diretos entre patrões e empregados, algo que assolou o mundo durante os anos 1920 e 1930.

Diversas realidades que atravessaram o tempo até os dias atuais nas relações de trabalho no Brasil são fruto desse estágio inicial do trabalhismo, na Era Vargas:

  • A carteira de trabalho, um documento onde o trabalhador mantém o registro de suas experiências, a comprovação de seus direitos, aumentos, férias, aposentadoria e outros. Na época, o documento possuía um caráter que perdeu com o tempo – era para patrões um instrumento de seleção, e para o governo e sindicatos, uma forma objetiva de controle.
  • O salário mínimo, considerado como a mínima contraprestação paga pelo empregador ao trabalhador. Com isso, o governo formulava um cálculo do custo básico de vida do trabalhador no ambiente urbano, obrigando patrões a pagar vencimentos mínimos nesse patamar. Em termos de classes, o mínimo logo evoluiria para pisos salariais, inicialmente nacionais e posteriormente regionais. Embora viesse na época como uma garantia e uma vantagem para o trabalhador, com o tempo os pisos e o salário mínimo seriam utilizados como forma de pagar menores salários ao trabalhador e eliminar a livre-negociação, ao que sindicatos responderiam com “acordos sindicais” para determinadas categorias.
  • Por fim, uma pesada legislação trabalhista, a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT, 1943). Baseada na Carta del Lavoro do fascismo italiano. A CLT reuniu todas as leis criadas no período Vargas e posteriormente teria diversas inclusões ao longo dos tempos, até se tornar o enorme ementário de leis, decretos e regulamentos atual.

Referências:

  • CASAGRANDE, Kelli Fátima. A nação como um corpo: o corporativismo como conceito elementar para compreender o trabalhismo no governo Vargas (1930-1945). 2017.
  • DE CASTRO GOMES, Angela. A invenção do trabalhismo. Editora FGV, 2015.

Por: Carlos Artur Matos

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