Antero de Quental nasceu nos Açores, em 1842, e suicidou-se em 1891, no lugar de nascimento.
Teve vida complicada por causa de seus conflitos íntimos que o levavam a se isolar às vezes, em outras vezes, a conviver em reuniões literárias ou partidárias, a filosofar materialisticamente em certos períodos, em outros, a debater-se na dúvida religiosa.
Foi protagonista da Questão Coimbrã em defesa das ideias realistas dos jovens, culminando com o artigo “Bom-senso e Bom-gosto”. Seu suicídio parece ter sido consequência de uma doença física e uma mental: impôs-se questionamentos filosóficos e religiosos para os quais não obteve respostas.
Delineiam-se, em Antero de Quental, três fases distintas. Na primeira delas, nota-se o predomínio de uma atitude romântica em temática religiosa. É uma poesia de entusiasmo adolescente, herança da educação paterna. Esse conteúdo é identificado em quase todos os poemas dos livros Raios de extinta luz e Primaveras românticas.
A segunda fase concentra-se em Odes modernas, poemas que evidenciam a fase realista do autor e sua adesão às ideias de justiça social, igualdade e dignidade humana. Para ele, então, o ato de escrever é um ato revolucionário, revelando a nítida influência das ideias de Proudhon.
Antero de Quental insistia que a sua obra tinha de ser revolucionária para corresponder ao seu tempo social, por isso os poemas dessa fase refletem o drama social da segunda metade do século XIX. A terceira fase, mais nítida no livro Sonetos, revela o poeta atormentado por questões humanas, filosóficas e metafísicas, resultando uma poesia dilemática, angustiada e pessimista, envolvida com ideias de morte e tentativas de explicar e entender Deus.
É na terceira fase (Sonetos) que o poeta atinge o ponto alto da sua técnica linguística e versificatória, a ponto de os críticos ficarem em dúvida se admiram mais o seu pensamento ou a sua forma. Conhecedor dos segredos da língua e da técnica, ele compôs versos esculturais pela solenidade do pensamento, pela majestade da frase e pela harmonia e beleza da musicalidade e ritmo. É considerado um dos grandes sonetistas europeus.
A sensualidade está ausente de sua poética por ter tido, como assuntos prediletos, a tristeza universal e a tragédia humana. Foi o maior poeta-filósofo em Língua Portuguesa e um dos maiores da Europa.
Livros do autor: Raios de extinta luz, Primaveras românticas, Odes modernas e Sonetos completos.
Texto do autor
Ao fazer a leitura do poema a seguir, atente para alguns traços típicos desse poeta, como o questionamento filosófico, o sentimento de frustração diante das imperfeições do cenário que se descortina à sua frente e observe, ainda, que, singularmente, não há qualquer alusão à figura feminina, entidade que sempre inspira os artistas e particularmente os poetas. Esse dado confirma a temática de Antero de Quental, prioritariamente voltada para questões metafísicas e sociais, sem espaço para a relação homem-mulher tão presente nas poesias em geral.
Conheci a beleza que não morre
E fiquei triste. Como quem da serra
Mais alta que haja, olhando aos pés a terra
E o mar, vê tudo, a maior nau ou torre,Minguar, fundir-se, sob a luz que jorre;
Assim eu vi o mundo e o que ele encerra
Perder a cor, bem como a nuvem que erra
Ao pôr-do-sol e sobre o mar discorre.Pedindo à forma, em vão, a ideia pura,
Tropeço em sombras, na matéria dura,
E encontro a imperfeição de quanto existe.Recebi o batismo dos poetas,
E assentado entre as formas incompletas
Para sempre fiquei pálido e triste.
QUENTAL, Antero de. Sonetos completos. Lisboa: Porto Lello & Irmão, 1965.
Por: Wilson Teixeira Moutinho