Considerada a primeira grande escritora brasileira, Cecília Meireles construiu uma obra consagrada. Seus temas universais, atemporais e espirituais fazem parte da tradição literária do Brasil, assim como suas crônicas, contos e literatura infantil.
Cecília Meireles: vida e obra
Cecília Benevides de Carvalho Meireles nasceu em 7 de novembro de 1901, no bairro da Tijuca, Rio de Janeiro. Órfã de pai e mãe desde os três anos de idade, foi criada pela avó materna. Formou-se professora e lecionou, ao mesmo tempo que exercia intensa atividade intelectual, colaborando em diversos jornais e revistas cariocas.
Seu primeiro livro de poemas, Espectros, lançado em 1919, teve boa acolhida da crítica e trazia influência nitidamente simbolista. Tal influência é confirmada pela sua participação na revista literária Festa, de cunho espiritualista, que defendia o universalismo, além da manutenção de algumas características mais tradicionais da poesia, mostradas no poema abaixo. No entanto, sua maturidade poética só se cristalizaria a partir de Viagem, de 1939.
A partir da década de 1930, passou a lecionar literatura luso-brasileira na Universidade do Distrito Federal (que na época ainda era o Rio de Janeiro), além de ministrar cursos e palestras em diversos países, como Portugal e Estados Unidos. Cecília morreu no Rio de Janeiro em 9 de novembro de 1964, deixando incompleto um poema épico em homenagem à sua cidade natal. Um ano depois de sua morte, a Academia Brasileira de Letras concedeu-lhe o Prêmio Machado de Assis pelo conjunto da obra.
Ao lado de Carlos Drummond de Andrade (1902-1987) e Vinicius de Moraes (1913-1980), Cecilia Meireles é a escritora mais representativa da poesia modernista.
Poetisa ou poeta?
Cecília Meireles não gostava de ser chamada de poetisa, mas de poeta. Dizia não ver necessidade de ‘‘sexualizar pessoas tão pouco concretas quanto os poetas”.
A estética de Cecília Meireles
Mário de Andrade, ao ler o livro Viagem (1939), caracterizou Cecília Meireles como uma poeta de “sábio ecletismo”. Realmente, sua obra tem temática variada, apesar da recorrência de alguns elementos (como o vento, a música, o tempo e o espaço, o mar e a solidão).
No início de sua carneira, a autora aproximou-se do grupo da revista Festa, formado por autores cariocas de influência simbolista. É desta fase seu livro de estreia, Espectros (1919). Embora o neossimbolismo venha a marcar seus versos de maneira perceptível (na musicalidade dos versos e na recorrência de temas como a passagem do tempo, a distinção entre o efêmero e o eterno e a melancolia), a autora não se limita a essa tendência, vindo a trilhar caminhos mais modernos, anos mais tarde. Portanto, em Vaga Música (1942) e Mar absoluto (1945) mantêm-se o tom intimista e a sonoridade dos versos, mas a linguagem e alguns versos livres os aproximam mais do modernismo literário.
Em boa parte de seus poemas Cecília Meireles preza o verso curto e os paralelismos, numa referência à poesia medieval portuguesa. Nesse sentido, constrói uma ponte entre a poesia moderna e a tradicional. Em termos temáticos, apresenta caráter universal, com predominância de uma postura reflexiva/filosófica na abordagem de temas como a transitoriedade do mundo, o infinito, o amor, o tempo e a natureza. Também se destacam os poemas metalinguísticos, em que a autora fala do próprio fazer poético, quase sempre associado à busca de eternizar a beleza, sempre efêmera, passageira.
Sua escrita era, antes de tudo, intuitiva, buscando compreender o mundo a partir de suas próprias experiências. Cecília classificava assim seus objetivos como poeta:
Acordar a criatura humana dessa espécie de sonambulismo em que tantos se deixam arrastar. Mostrar-lhes a vida em profundidade. Sem pretensão filosófica ou de salvação – mas por uma contemplação poética afetuosa e participante.
GOLDSTEIN, Norma & Barbosa, Rita de Cássia. Literatura comentada: Cedia Meireles.
Em seus versos, a musicalidade e outros elementos abstratos por vezes parecem mais importantes que o conteúdo semântico dos versos.
Cecília Meireles e a música
A poesia de Cecília Meireles tem fortes laços com a música popular brasileira, sobretudo graças ao cantor-compositor Fagner, que musicou poemas da escritora, alguns dos quais sem créditos para a poeta, o que motivou um processo judicial de suas herdeiras contra o cantor cearense.
O poema “Motivo”, por exemplo, foi musicado por Fagner no CD Eu canto (Quem viver, chorará), gravado pela CBS em 1978.
Por: Paulo Magno Torres