O surgimento da vida na Terra já foi objeto de diversas teorias ao longo dos anos. Dentre as muitas teorias formuladas, há duas vertentes principais de estudo: a abiogênese (geração espontânea) e a biogênese (a vida surge de outra forma de vida). Nenhuma delas, contudo, ofereceu até então uma explicação incontestável sobre os eventos que culminaram na origem da vida.
Abiogênese
Recebe o nome de teoria da geração espontânea ou abiogênese a ideia de que elementos inanimados podem ter, de alguma forma, ter sido rearranjados de forma espontânea para criar vida. A geração espontânea foi, pela maior parte da civilização, a teoria defendida por filósofos e estudiosos.
Desde a Antiguidade até pelo menos o começo do século XVII, associávamos o surgimento de pequenos seres vivos, como moscas ou os girinos, a matéria sem vida. Nesse processo, acreditavam, a matéria também chamada matéria bruta era convertida nesses pequenos animais. Até essa época ninguém havia acompanhado o desenvolvimento desses animais a partir de ovos.
A matéria bruta, por outro lado, geralmente era constituída de material orgânico em decomposição. A mera observação sugeria que, em tecidos mortos, larvas de mosca, por exemplo, surgiam simplesmente por conta da decomposição dos tecidos vivos. Do mesmo modo, larvas e girinos surgiam nos pântanos em razão dos sedimentos e material orgânico apodrecido, de vegetais e outros animais. Similarmente ainda, parasitas como a tênia e a lombriga simplesmente “apareciam” no intestino humano.
A abiogênese foi primeiramente discutida na Grécia Antigo por filósofos. O mais célebre deles, Aristóteles (384-322 a.C.), partiu tão somente da observação para formular teses a respeito de como alguns animais surgiam. Moscas e baratas, por observação, surgiam do lixo. Do mesmo modo que girinos e larvas de peixes, por conclusão, deveriam surgir a partir do lodo depositado ao fundo de rios e lagos.
A teoria da geração espontânea apoiou-se na crença de um “princípio ativo” ou “força vital”, isto é, da capacidade de um objeto inanimado se transformar em uma forma de vida.
O biólogo italiano Francesco Redi (1626-1697) é hoje considerado o ponto de questionamento definitivo da teoria da geração espontânea. Em 1668, o biólogo realizou um experimento que mostrou que o material orgânico que supostamente gerava larvas de mosca, quando colocado em um frasco selado, não era capaz de gerar nenhuma larva.
Biogênese
A biogênese admite que a vida surge de outra forma de vida preexistente. O experimento de Francesco Redi é, de certo modo, o ponto de partida dessa teoria totalmente nova.
Redi testava a hipótese de que as moscas, nos frascos abertos, originavam-se de ovos que foram depositados por outras moscas que entravam nos frascos. Ou seja, os vermes não surgiam “do nada”, mas sim a partir de ovos depositados por moscas – moscas estas que eram o estágio posterior da própria larva que infestava tecidos mortos.
Os resultados obtidos na experiência mostram que, nos frascos abertos, surgiram larvas de moscas na carne em decomposição. Nos frascos fechados, não surgiram larvas. Redi e seu simples experimento aposentaram uma teoria de milênios e abriram caminho para toda uma nova teoria.
A reprodução dos seres vivos passou, a partir desse ponto, a ser o fenômeno considerado como gerador da vida em qualquer espécie. Contudo, com avanços tecnológicos e novas técnicas de microscopia, a partir da metade do século XVIII, houve novo embate entre as duas teorias.
A descoberta dos primeiros organismos unicelulares e microscópicos, como bactérias, protozoários e fungos, levou a uma nova discussão. Como esses seres não colocavam “ovos”, deveriam ter um processo próprio de reprodução e, principalmente, “surgimento”.
Novamente, a abiogênese pareceu a explicação mais fácil e correta para essa nova classe de seres. O que deveria ser um avanço, por conta da total ignorância da humanidade a respeito da existência de micro-organismos até então, deu novo fôlego à teoria da geração espontânea.
O experimento de Louis Pasteur
Em 1860, o cientista francês Louis Pasteur decretou o fim da abiogênese como uma teoria cientificamente aceita em relação à reprodução das espécies, realizando um experimento com frascos que possuíam gargalos em forma de “S”, ou pescoço de cisne, como dizem alguns.
Segundo a visão de Pasteur, a biogênese era a única teoria suficientemente capaz de explicar a reprodução de qualquer espécie – incluindo todo o novo rol de micro-organismos que vinham sendo descobertos.
Após conformar o gargalo do frasco no formato desejado, Pasteur ferveu um caldo repleto de nutrientes. O formato do frasco permitiu que o caldo permanecesse sem contaminações, mesmo com a abertura no recipiente.
As gotículas de água se precipitavam ao longo do pescoço comprido do frasco, impedindo que micro-organismos presentes no ar atingissem o caldo.
Uma vez removida a parte curvada no topo do frasco, e retomado o contato direto com o ar, a contaminação ocorria naturalmente e o caldo tornava-se repleto de micro-organismos.
Estava comprovado: sem o contato direto com o ar, a vida não proliferava no meio, ainda que este estivesse cheio de nutrientes essenciais à proliferação da vida.
Com base nas experiências de Pasteur, a biogênese passou a ser aceita definitivamente. Os experimentos de Pasteur ainda culminariam no desenvolvimento de uma técnica para conservação e esterilização de alimentos e bebidas, a pasteurização – uma técnica que submete líquidos e alimentos a altas temperaturas e resfriamentos de forma alternada.
Ainda assim, a biogênese é hoje a única teoria aceita para explicar o fenômeno da reprodução das espécies, contudo não explica de forma satisfatória como surgiu o primeiro indício de vida. Nesse caso, a abiogênese parece novamente uma explicação mais viável: da união aleatória de determinadas moléculas de aminoácidos e outros compostos, teria surgido a primeira molécula de RNA capaz de criar cópias de si mesma. Porém, a discussão desse novo “round” ainda está longe de ser encerrada.
Por: Carlos Artur Matos