Epicuro dividiu sua filosofia em três áreas: lógica, física e ética. Para ele, apenas o verdadeiro conhecimento, obtido por meio dessas três partes, poderia levar o homem a seu objetivo natural: o prazer.
Epicuro (c. 341-270 a.C.) Filósofo grego cujo pensamento caracterizou-se pela ideia de que o fim natural do homem é o prazer. A maior parte de sua obra não foi conservada, exceto as cartas e os aforismos, e suas ideias são conhecidas por meio dos textos de Lucrécio e de Diógenes Laércio.
A filosofia, caminho para a felicidade
Para ter prazer e ser feliz o homem precisa, em primeiro lugar, dominar a lógica. Somente ela lhe dá os recursos necessários para fazer a distinção entre verdade e falsidade. Usando a lógica, qualquer pessoa pode obter o conhecimento verdadeiro sobre o que é a realidade e qual seu papel nela.
Aqueles que conhecem a estrutura do real (a física) libertam-se das falsas opiniões, que o levam a temer a morte e os deuses. Libertam-se, igualmente, do desejo incontrolável de experimentar prazeres e do sofrimento causado pela dor. A satisfação dos prazeres físicos é natural e necessária, mas, para não causar dor, deve ser controlada. Além disso, o homem precisa entender que há outro tipo de prazer, não apenas natural mas também ético: aquele ao qual se chega pela ausência de perturbação da mente (ataraxia) e de dor (aponia). É essa, segundo Epicuro, a verdadeira felicidade.
Um conhecimento canônico
A teoria do conhecimento desenvolvida por Epicuro ficou conhecida como “canônica” por estabelecer cânones (normas que constituem um método) para reger e orientar as formas de conhecer. Para os epicuristas, o saber tem início na experiência sensível, ou seja, naquilo que os sentidos captam do mundo. Guardadas na memória, as experiências, repetidas muitas vezes, formam as noções gerais, ou conceitos.
Um exemplo: quando alguém ouve a palavra “cavalo” sabe exatamente do que se trata porque as experiências sensíveis, armazenadas na memória, indicam-lhe o que é um cavalo. Epicuro dava a esse fenômeno o nome de “antecipação” (prolepsis): a pessoa que ouvia a palavra “cavalo” anteciparia sua presença porque, embora o animal não estivesse sendo, naquele instante, apreendido pelos sentidos, sua Imagem estava guardada na memória.
Uma grande quantidade de antecipações permite a formação de juízos. Para saber se ele é verdadeiro ou falso, os epicuristas utilizavam dois tipos de verificação. O primeiro: um juízo era verdadeiro quando correspondia ao que era captado pelos sentidos. O segundo: quando não houvesse possibilidade de observação sensível, era preciso verificar se havia (ou não) contradição entre o juízo e as experiências guardadas na memória.
As diferentes classificações dos desejos
- Naturais e necessários: os que eliminam a dor, como a bebida e a comida.
- Naturais, mas não necessários: os que somente dão cor ao prazer, mas não extirpam a dor, como os alimentos refinados.
- Nem naturais nem necessários: as coroas e as estátuas, por exemplo.
O princípio de autarquia
Estar no mundo significa saber escolher. O corpo também ajuda a encontrar os desejos adequados. As escolhas têm de colaborar para a autonomia (autarquia) e a autossuficiência do homem. Essa afirmação do próprio eu diante das possibilidades naturais ou antinaturais do mundo é um indício de que se conseguiu um equilíbrio ao qual Epicuro, seguindo Demócrito, chamará de ataroxia ou serenidade da alma.
A física: a ordem do mundo
A ética, para Epicuro, deve conciliar-se com uma interpretação do mundo e das forças que o governam. Se o homem se deixar dominar pelo medo diante dessas forças, não alcançará nem autonomia nem paz interior. Por isso, as superstições devem ser descartadas. Os deuses, segundo o filósofo, até podiam existir, mas não se preocupavam com os seres humanos. Viviam em outro mundo, sem ligação alguma com o terrestre.
Essa ideia opõe-se a concepções fatalistas, segundo as quais a vida é predeterminada por forças superiores. Para Epicuro, o homem deve libertar-se dos deuses e da ideia da morte, causas de intranquilidade e infelicidade.
Os átomos
Epicuro, como Demócrito, sustenta que os corpos são formados por partes invisíveis chamadas átomos. Os átomos têm três propriedades – extensão, forma e peso – e movimentam-se na vertical, de cima para baixo. Esse movimento é etemo e apresenta, às vezes, um desvio, uma declinação que introduz neles um princípio de liberdade.
Há uma infinidade de átomos, assim como há uma infinidade de mundos, que se formam e desaparecem em função de um turbilhão de átomos. Esses mundos, reais ou possíveis, terão, cada qual, seus seres, produto da evolução.
O ponto de vista epicurista
Em Carta sobre a felicidade (a Meneceu) encontra-se o resumo de todas as teorias do epicurismo sobre a vida, a felicidade e o prazer. Epicuro acentuava a importância do corpo como princípio fundamental da existência humana.
O ponto de vista epicurista consistia em aceitar que o corpo é a única “realidade que somos” e, consequentemente, é a verdadeira medida das coisas. Entretanto, essa “medida” não é somente intelectual, como pareciam indicar as palavras do sofista Protágoras.
O corpo e suas necessidades são garantia originária do bem-estar humano. Portanto, o prazer do corpo é natural.
O prazer é o maior bem que expressa nossa natureza (…) e, por isso, dizemos que o prazer é o princípio e o fundamento da vida feliz. Reconhecemos o prazer como bem primeiro, como natural a nós. Dele partimos para tudo o que escolhemos ou rejeitamos, e a ele chegamos tendo a sensação por norma de todo e qualquer bem.
Epicuro, Carta sobre a felicidade (a Meneceu).
“Os do Jardim”
Epicuro, aos 32 anos, adquiriu uma casa com um grande jardim nos arredores de Atenas e nela criou uma escola filosófica constituída por um grupo de pessoas unidas por estreitos laços de amizade. Eram conhecidos popularmente como “os do Jardim”.
Entre eles havia escravos e mulheres – algo impensável na Academia platônica e no Liceu aristotélico, uma vez que na sociedade grega homens e mulheres eram considerados seres inferiores -, e todos se interessavam, sobretudo, em elaborar um método para encontrar a paz e a felicidade. Epicuro e seus amigos levavam no Jardim uma vida moderada, e suas formas de convivência deixavam perceber a influência do caráter amável e generoso do fundador do grupo.
Por: Roberto Braga Garcia
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