A dinâmica da modificação dos espaços geográficos é uma das principais preocupações da geopolítica. O geógrafo alemão Friedrich Ratzel (1844-1904) foi um dos primeiros a sistematizar um estudo sobre a forma de modificação dos espaços e sobre a influência dos estados politicamente organizados sobre essas modificações.
Ainda que muito influenciado pelo contexto histórico em que viveu, o da unificação da Alemanha, e procurasse justificar as atitudes políticas do governo de seu país, que considerava ideais, Ratzel deixou uma profunda contribuição ao campo de entendimento da dinâmica internacional da geopolítica, sendo considerado seu fundador na Alemanha.
Suas reflexões e postulações sobre a modificação dos espaços, sobre os conflitos de interesses dos estados e sobre as formas pelas quais se processavam tais transformações ficaram conhecidas como teoria dos espaços crescentes ou leis de Ratzel. Resumidamente, são elas:
As sete leis de Ratzel
- A expansão do estado aumenta com o avanço da cultura.
- O aumento espacial dos estados acompanha diversas manifestações do seu desenvolvimento: ideologia; produção; atividade comercial; poder da sua influência e do seu esforço no que diz respeito ao proselitismo (divulgação de suas ideias, convicções e planos).
- Os estados estendem-se assimilando ou absorvendo as unidades políticas de menor importância.
- A fronteira é um órgão situado na periferia do estado — por meio desse alargamento, ele materializa o crescimento, as forças e as mudanças territoriais.
- Ao proceder a sua extensão espacial, o estado se esforça para absorver regiões importantes para o seu desígnio, por exemplo, o litoral dos estuários fluviais, as planícies e os territórios mais ricos em termos de produção.
- É do exterior que vem o primeiro impulso, levando o estado para a extensão de território movido por uma civilização menos desenvolvida que a sua.
- A tendência geral é a assimilação ou absorção das nações mais fracas, convida a multiplicar as apropriações de territórios num movimento que parece com a autoalimentação.
Essa concepção, ainda que fortemente marcada por determinada influência ideológica, foi predominante no entendimento da geopolítica durante décadas.
Exemplos de aplicação das leis de Ratzel
Aplicando o raciocínio das leis de Ratzel a casos provenientes do contexto histórico real, temos o imperialismo europeu dos séculos XIX e XX como exemplo acabado dessa doutrina: os países europeus industrializados, arrogando a si mesmos uma “missão civilizadora”, amparados por uma concepção de superioridade tecnológica e cultural, empreenderam vastas campanhas de domínio sobre as regiões pobres dos continentes africano e asiático, em especial.
Essas regiões eram, e continuam sendo, importantes fornecedoras de matérias-primas valiosas, celeiros de produção agrícola e potenciais currais de mercado consumidor, além de possuírem contingentes populacionais significativos, aproveitáveis sob forma de mão de obra.
A conveniência do domínio dessas regiões por parte dos países industrializados é óbvia, e a possibilidade de justificar esse domínio por meio de um discurso idealizado de contribuição cultural e civilizadora foi amplamente usada para a formação de impérios coloniais contemporâneos.
O estado alemão, unificado tardiamente e, portanto, atrasado em relação às potências tradicionais na construção de seu império, usou a teoria de Ratzel para justificar seu empreendimento colonizador. O resultado último dessa aplicação foi sintetizado na doutrina do Lebensraum (espaço vital), segundo a qual a expansão territorial era uma questão de sobrevivência para o povo alemão.
A ampliação do espaço (raum) ocupado pelo povo alemão era a resposta necessária à ampliação do consumo de recursos e do aumento das expectativas de produção de riquezas por parte desse mesmo povo, ambas resultantes de uma circunstância de progresso e evolução.
A contradição de interesses entre os povos dominadores e dominados no bojo desse processo revelou-se de forma aguda. O Império Austríaco e o Segundo Império Francês, estados mais antigos que o alemão e estabelecidos em bases políticas cristalizadas, resultantes de longos processos históricos, viam com desconfiança, e mesmo com temor, o surgimento de um novo estado na região, temor agravado por uma perspectiva de este estado se tornar, rapidamente, uma grande potência militar e econômica.
A política do estadista prussiano Otto von Bismarck, líder do processo de unificação que resultou na estrutura do moderno estado alemão, era amplamente calcada na concepção da Alemanha que já nasce grande, expressa pela máxima Deutschland über alles — Alemanha acima de tudo.
Os resultados práticos desta doutrina foram as guerras austro-prussiana (1866) e franco-prussiana (1870-1871). Inspirados por um discurso fortemente nacionalista, os prussianos venceram esses dois conflitos de forma convincente, conquistando o espaço necessário para o lançamento das bases territoriais e políticas do estado alemão. A teoria das leis de Ratzel confirmava, na prática, sua eficácia.
As leis de Ratzel atualmente
O discurso de Ratzel, apesar de marcado por razões culturais que lhe eram muito particulares, continua atual, considerando que os países contemporâneos, em especial os de postura agressiva no mercado e na política internacional, ainda se valem de raciocínios similares para embasar sua intenção de domínio sobre outros estados, seja cultural, econômico, político, seja de qualquer outra forma de dominação que se possa conceber.
Bibliografia:
ALBUQUERQUE, Edu Silvestre de. Uma breve história da geopolítica. Rio de Janeiro: Cenegri — Centro de Estudos em Geopolítica e Relações Internacionais, 2011.
Por: Wilson Teixeira Moutinho