Causas da revolução de 1932
O triunfo da Revolução de 1930 teve por contrapartida a derrota do setor cafeeiro, sobretudo aquele diretamente ligado à oligarquia paulista. Como esperado, São Paulo diminuiu-se politicamente e, do ponto de vista econômico, desorganizou-se, agitado pelas consequências da fragilização temporária do protecionismo estatal sobre as atividades cafeeiras.
Mesmo os segmentos médios urbanos paulistas ressentiram-se da crise do café, colhidos que foram pelos seus devastadores efeitos colaterais. Tanto a oligarquia quanto os setores médios entendiam que somente a reconstitucionalização do país reacomodaria as forças políticas em litígio, promovendo um ajuste institucional capaz de contemplar vencedores e perdedores, afinando-os ao sintonia comum do desenvolvimento nacional.
Diversificados por essa resistência política, os então extintos Partido Democrático (que auxiliara a Aliança Liberal, mas que se frustrara por não ter sido beneficiado com postos relevantes no governo federal) e Partido Republicano Paulista (porta-voz dos interesses da derrotada oligarquia cafeeira), aproximaram-se, alinhando-se na oposição formal ao centralismo personalista de Vargas. Por consequência, surge, em 1932, a Frente Única Paulista (FUP), convergindo forças que reivindicavam a execução do pré-anunciado compromisso com a legalidade via convocação imediata de uma Assembleia Nacional Constituinte.
O início do conflito
O motivo inicial da revolução de 1932 foi a nomeação do tenente pernambucano João Alberto como interventor em São Paulo. AFUP, rejeitando a indicação e hostilizando o mando do poder central, orquestra, articula e põe nas ruas um agitado movimento que, além de uma nova ordem constitucional, também exigia, provincianamente, um interventor civil e paulista para São Paulo.
Getúlio recua tacitamente. Destitui o tenente interventor militar pernambucano e indica, em seu lugar, sucessivos, mas sempre rejeitados, governadores para São Paulo. O último deles foi o paulista civil Pedro de Toledo. Pelo mesmo ato, o Governo Provisório instalou o general Isidoro Dias Lopes, simpatizante da FUP, no comando militar de São Paulo. Na mesma ocasião, publicou um Código Eleitoral, fixando para 1933 eleições para a formação da prometida Assembleia Nacional Constituinte.
Não obstante, tais medidas não atenderam, de fato, aos interesses ocultos que regulavam a revolução paulista. As oligarquias permaneciam fora do poder decisório central. As camadas médias continuavam desprovidas de representatividade político-formal. Todavia, essa ambiência tensa e nervosa somente revelar-se-ia conflitiva em maio de 1932.
Na manhã do dia 23, os estudantes constitucionalistas Martins, Miragaia, Dráusio e Camargo foram assassinados a tiros por violentíssima repressão policial durante pacífica manifestação estudantil, em frente ao prédio da associação tenentista Legião Revolucionária. As iniciais dos sobrenomes dos quatro manifestantes mortos (MMDC) designaram, a partir de então, o movimento rebelde paulista, agora radicalizado em torno da bandeira da reconstitucionalização pela via sangrenta da luta armada.
A guerra civil
Segundo prévia e sigilosa combinação, a sublevação armada de São Paulo seria deflagrada pelo general Isidoro Dias Lopes e seria imediatamente seguida pelo levante das guarnições militares de Mato Grosso, todas sob firme comando do general Bertoldo Klinger.
O Rio Grande do Sul também participaria. Segundo o plano, as desencantadas oligarquias gaúchas seguiriam o líder caudilhesco Borges de Medeiros contra a inconsistente política econômica praticada pelo Governo Provisório. Minas se levantaria em seguida, mobilizada pelo chamamento de Arthur Bernardes, ex-presidente da República. Aos civis Pedro de Toledo e Francisco Morato caberia a liderança política do movimento.
Conforme o previsto e combinado, a revolução constitucionalista eclodiu, cheia de esperanças, em 9 de julho de 1932.
Entretanto, o levante paulista emergiu frágil, marcado pelas deserções de Minas e Rio Grande do Sul. Borges da Fonseca (governador de Minas) e Borges de Medeiros decidiram permanecer fiéis ao governo federal, deixando São Paulo e Mato Grosso abandonados na luta. Na verdade, ainda que descontentes, mineiros e gaúchos temiam que a revolta assumisse contornos separatistas, fragmentando a unidade política nacional. Ademais, a franca identidade do movimento com o revanchismo das elites cafeeiras paulistas não estimulava outros estados, todos desconfiados do caráter regressista e contra-revolucionário da ação armada em curso.
Consequênicas e o fim do conflito
Passados três meses de intensos combates, os constitucionalistas cederam. O cerco ao porto de Santos por tropas oficiais impediu que os rebeldes paulistas recebessem munições e matérias primas para as indústrias de armamentos. Desprovidos da infraestrutura bélico-militar necessária para a continuidade da luta, esmagados por pesados bombardeios e sufocados pela superioridade numérica das forças “legais”, os paulistas depuseram armas, submetendo-se ao poderio do governo provisório.
Ao término dos conflitos, Getúlio Vargas manejou com habilidade o cenário político resultante da Revolução de 1932. Ao mesmo tempo em que buscava uma recomposição com São Paulo, nomeou interventor um velho oficial do exército, general Castilho de Lima, afastando definitivamente os tenentes radicais do centro das decisões políticas. Ato contínuo, fez cumprir o calendário do Código Eleitoral, confirmando as eleições constituintes previstas para maio de 1933.
Por: Renan Bardine