A Revolução Praieira encerrou o ciclo das conturbações imperiais. Foi a última das sublevações contra o unitarismo do Império e o ponto culminante da tradição revolucionária pernambucana, fortemente marcada pelo espírito republicano tão difundido nos levantes de 1817 e 1824.
A eclosão da Praieira vinculou-se a um conjunto de variantes sociais e políticas, imprimindo-lhe uma tal gravidade e colocando-a entre as revoltas sociais mais relevantes da história brasileira. Além disso, a última manifestação armada do período imperial insere-se no quadro das Revoluções Liberais de 1848, que tendo como centro de irradiação a França acabaram por se difundir por toda a Europa Continental, sendo conhecida como a Primavera dos Povos.
As razões da Revolução Praieira
Em Pernambuco, os atritos tinham também suas origens nas eternas rivalidades entre grupos regionais que lutavam pelo poder e na agitação decorrente dos desencontros entre os interesses locais e as decisões do Poder Central, sempre prejudiciais à província. Tais perturbações eram quase sempre engrossadas pelas massas populares, das quais se serviam as elites para atingirem seus ambiciosos propósitos.
Essas massas, por sua vez, trouxeram à baila suas insatisfações, derivando daí um verdadeiro turbilhão que arrastou federalistas, socialistas utópicos, republicanos e nativistas e os setores populares. Portanto, a revolução revestiu-se de uma feição nitidamente popular e possui suas justificativas na então repugnante estrutura social pernambucana, em que o poder era monopolizado pela família Cavalcanti.
Consequentemente, era esse grupo que manipulava o processo político-partidário e se firmava através de inúmeras investidas inescrupulosas, com o hábito de falsificar moedas, contrabandear e roubar escravos e a contratação de crimes de homicídios. Tanto os Cavalcanti quanto os Rego Barros, outra poderosa família aristocrática, como era de se esperar, controlavam o Partido Liberal e o Partido Conservador, no âmbito da província, além de explorar e oprimir as populações rurais sob seus domínios.
Não bastasse a opressão na zona rural, os habitantes da cidade também sofriam restrições. A vida urbana não favorecia a classe média incipiente, pois, tanto o comércio como o artesanato eram monopólio lusitano, impedindo a integração daquela, tanto nas profissões, como no comércio de retalhos.
De um lado e de outro, portanto, os setores populares sofriam as restrições reveladoras dos profundos desequilíbrios sociais. Estes desequilíbrios sociais foram aproveitados pelo grupo político chamado “A Praia”, que desenvolveu uma obstinada campanha contra os poderosos lati- fundiários e, principalmente, contra os portugueses.
Os praieiros (denominação proveniente da Rua da Praia, onde estava instalado o “Diário Novo”, jornal dos rebeldes) formavam a ala urbana do Partido Liberal e tinham líderes de várias concepções políticas, como Nunes Machado, editor do Jornal “O Repúblico”; Pedro Ivo e Borges da Fonseca, autor do “Manifesto ao Mundo”, um documento que apresentava as reivindicações dos praieiros. As ideias socialistas (que não eram ainda marxistas), por sua vez, foram veiculadas por estrangeiros, como Louis Vauthier, contratado pela província para embelezar e modernizar o Recife.
O Manifesto ao Mundo, de Borges da Fonseca, contendo as principais reivindicações dos rebeldes praieiros.
- Voto livre e universal:
- Liberdade total de Imprensa;
- Direito ao trabalho;
- Inteira e efetiva autonomia dos poderes constituídos:
- Nacionalização do comércio varejista;
- Adoção do Federalismo;
- Reforma do Poder Judiciário;
- Estinção dos juros;
- Abolição do sistema de recrutamento;
- Abolição do Poder Moderador;
- Supressão da vitaliciedade do Senado;
- Expulsão dos portugueses
A eclosão do movimento armado
O clima de insurreição iniciara-se durante o governo liberal de Chichorro da Gama, que afastou, temporariamente, o predomínio dos conservadores pernambucanos solidificando as posições praieiras. Seu mandato foi pontilhado por uma intensificação da violência e deflagrou luta aberta quando ocorreu sua destituição, em virtude da derrubada dos liberais no plano nacional, em 1848 e, novamente, a ascensão dos conservadores.
A sucessão de Chichorro da Gama foi acompanhada de uma forte oposição em toda a província. O novo presidente, Ferreira Pena, não teve pulso para controlar a revolta que teve como ponto de partida a cidade de Olinda, sendo substituído por Vieira Tosta, que conseguiu organizar a resistência legalista.
Enquanto a Revolução espalhava-se pela “zona de mata”, os praieiros resolveram atacar Recife. Contudo, próximo aos bairros de Soledade e dos Afogados, foram vencidos por Vieira Tosta. Neste combate morreu Nunes Machado e Borges da Fonseca retirou-se para o interior; tentando espalhar a revolta na Paraíba, enquanto Pedro Ivo tentou instalar-se no sul de Pernambuco. Esta dispersão os enfraqueceu. Após cinco meses a rebelião estava sufocada, apesar de Pedro Ivo ter conseguido algumas vitórias sobre as forças imperiais. Acabou sendo preso em Alagoas e transferido para o Rio de Janeiro de onde fugiu, de maneira espetacular. Pedro Ivo, exilado num barco inglês, veio a falecer a caminho da Europa, vítima de tuberculose.
Em 1852, foram anistiados todos os implicados na revolução praieira que foi reprimida até com certa facilidade.