No altiplano andino (região planáltica nos Andes, em altitudes muito mais elevadas que os planaltos brasileiros), mais propriamente no atual Peru, uma civilização despontou para criar uma herança admirada até os dias de hoje, os Incas. As origens dos incas são obscuras – eles certamente estão relacionados a diversas outras civilizações e tribos da região, mas o fato é que em algum momento no final do século XIII, o povo inca originário deixou a região de Huari para se instalar ao redor da atual cidade de Cusco.
Em algumas décadas, os incas estenderiam seu império por toda a região central da cordilheira do Andes, construindo uma nação que controlava mais de 10 milhões de pessoas. No apogeu dessa civilização, de 1438 a 1532, o Império Inca estendia-se por cerca de quatro mil quilômetros quadrados, com domínios ao norte até onde hoje encontra-se o Equador, até a área central do atual Chile, além de áreas atualmente sob o controle da Bolívia e da Argentina.
Origem e história
Na América do Sul, ao final do século XIII, os incas, originários da região Huari, fixaram-se no vale de Cusco. A região estava ocupada por alguns grupos aymarás, que foram assimilados pelos incas. Antes dos incas, os Andes eram em grande parte dominados por dois império: os Tiwanaku e os Huari.
Os incas eram uma tribo camponesa que vivia em regiões próximas de Cusco, por volta do ano XII. Segundo a lenda, Cuzco foi fundada por dez ayllus. Cada ayllu era um clã patrilinear endogâmico, ou seja, uma unidade de parentesco cujos membros acreditavam ser descendentes de um antepassado comum. Cusco foi dividida em quatro partes (“Barrios”) e este modelo tetrapartite foi aplicado pelos incas em fundações posteriores.
As bases do Império Inca se firmaram no final do século XIV, antes disso, os Andes eram uma área de culturas esparsas, antigas civilizações, tribos independentes e povos isolados.
Pachacuti foi o chefe que transformou o Reino de Cusco no Império de Tawantinsuyu. A vitória dos incas sobre os chanca, em 1438, finalmente levou à consolidação de Pachacuti como imperador de toda a região. Ele e seu filho Tupac-Inca, que governou de 1471 a 1493, expandiram o império por centenas de quilômetros, ao norte e ao sul.
Huayna Capac, avançaria o império para o sul dos Andes, morrendo em 1527, depois de dividir o Império entre seus dois filhos, Atahualpa e Huáscar. Os sucessores por alguns anos mantiveram fortes disputas pelo controle total da região, até que Atahualpa derrotou Huáscar.
Contudo, antes que pudesse consolidar seu império recém-conquistado, Atahualpa teria de lidar com uma ameaça maior que a do irmão: os espanhóis.
Sob o comando de Francisco Pizarro, os espanhóis chegaram a Cajamarca em 15 de novembro de 1532. Vendo no conflito entre irmãos uma possibilidade para dominar mais rapidamente a região, espanhóis cercaram e capturaram o chefe Atahualpa. Os incas ofereceram, como resgate, ouro e prata em abundância. Os espanhóis obviamente aceitaram o resgate, mas Atahualpa seria de qualquer maneira julgado e executado pela corte espanhola.
A população inca sofreu por anos com pesados tributos, um controle sob mãos de ferro espanholas e violência, porém não se dissipou completamente. Descendentes dos incas, mesmo após o fim do império, ainda podem ser encontrados em dezenas de tribos indígenas falantes do quechua, na Bolívia, no Equador, no Peru, entre outros.
A sociedade dos incas
Os incas eram formados por diversas tribos e mantinham rígida hierarquia social, dividindo-se em classes distintas, ou estamentos (praticamente não havia mobilidade entre elas):
- o imperador
- a nobreza
- os chefes locais
- os artesãos e agricultores
- os servos e os prisioneiros de guerra
O imperador era o comandante político, militar e religioso supremo – talvez não equiparado a um Deus, como na cultura egípcia, por exemplo, mas com poderes nesse patamar. Em geral, o imperador casava-se com a irmã, de modo a manter pura a dinastia.
A classe aristocrática era formada por parentes do imperador e agregados, e ocupava altos cargos administrativos, além de possuírem as terras melhores para o cultivo. Os agricultores e artesãos pagavam seus tributos ao Estado na forma de trabalho e servos e prisioneiros compunham a classe mais baixa, equiparados a escravos.
A educação, como em muitas culturas antigas, era uma exclusividade das classes mais abastadas. Contudo, crianças aprendiam o ofício e as atividades dos pais. Entre as classes mais baixas, apenas meninas na casa dos dez anos de idade eram às vezes selecionadas para frequentar uma escola especial em Cusco, que as preparada para servir ao imperador ou desposar membros da nobreza.
Política
O governo inca era despótico, ou seja, totalmente comandado por um imperador, visto como filho do deus Sol. O grandioso exército era o braço que garantia o poder supremo do governante. O imperador e o governo garantiam a segurança da população e permitiam que terras fossem usadas para o cultivo, cobrando em troca pesados impostos, em geral pagos por meio do trabalho. Além do cultivo ou de ofícios de artesão, trabalhadores tinham de fornecer sua mão-de-obra para projetos e obras do governo, além de cumprir o serviço militar.
Um sistema elaborado de organização política dividia o governo em grandes grupos. As divisões menores possuíam administrações locais – algo parecido com uma província. Dentro dessas províncias, havia subdivisões em múltiplos de de dez. Por exemplo, cada grupo de dez chefes de família possuía um líder.
O ponto mais fraco do sistema de governo inca era a forma de sucessão. O imperador deveria escolher seu filho mais competente, entre os gerados por sua esposa principal, e treiná-lo para o cargo. Porém, quando o imperador morria antes que pudesse selecionar e treinar o sucessor, guerras e conflitos entre herdeiros eram praticamente garantidos.
Cidades
Os incas construíram grandes centros urbanos. Cusco (ou Cuzco), a capital, fica a 3.350 m de altitude e até hoje é uma das maiores cidades do Peru. Em Cusco estava o Templo do Sol e o coração do Império Inca, guardados pela poderosa fortaleza de Sacsahuaman.
Além de Cusco, um dos centros que se destaca é Machu Picchu, com um complexo arquitetônico localizado a 130 km da capital inca. As ruínas da cidade – que também tinha área destinada à agricultura e à criação de animais – mostram-nos aspectos do cotidiano de seus habitantes: estábulos para criação de animais, como lhamas e, ainda, espaços de uso diário, como cozinhas, banheiros, entre outros. Machu Picchu é atualmente uma das maravilhas do mundo e uma das heranças mais bem preservadas da cultura inca em seu apogeu.
A comunicação entre as cidades era feita por uma ampla rede de estradas – que a exemplo dos romanos foi um dos grandes instrumentos de expansão do império. Essas estradas possuíam entrepostos denominados tampus, onde as pessoas eventualmente se abrigavam em viagens e onde ficavam mensageiros que passavam as mensagens de um tampu para outro.
Outras cidades incas famosas são Ollantaytambo, no altiplano peruano, próximo a Cusco, e Pachacamac, na planície, perto da atual capital do Peru, Lima.
Trabalho
O trabalho era obrigatório para todos – homens ou mulheres. As mulheres atuavam terras dedicadas ao sustento do Estado e em templos, enquanto os homens serviam em obras públicas e nas forças militares. O trabalho por conta do governo ainda envolvia a extração de minerais preciosos, acumulados para rituais religiosos e peças da nobreza.
Restava aos incas, ainda, a atividade militar. Muitos incas não tinham como obrigação o trabalho no campo ou em obras, e assim serviam o exército.
A economia dos incas
Baseava-se na agricultura intensiva, especialmente de milho e batata. O Estado, incorporando a figura do imperador, era dono de todas as terras – e decidia como distribuí-las. A colheita era armazenada e às vezes processada e enviada para todos os cantos do império para alimentar militares, sacerdotes e administradores. Os incas, contudo, zelavam para que nenhuma faixa da população ficasse à míngua e à fome.
Uma parte da colheita era também armazenada em depósitos, para lidar com períodos de baixa produtividade.No litoral, a cultura de bens agrícolas ocorria de forma mais pulverizada e diversificado: milho, abóbora, muitas variedades de feijão, pimenta, amendoim, algodão, tomate, batata-doce, mandioca-doce, abacate e outras plantas. Nas regiões do altiplano, o povo construía terraços nas encostas para aumentar a terra cultivável e evitar a erosão – o que explica as imagens peruanas com os famosos platôs nas montanhas.
A cultura dos incas
Religião
O Império Inca era teocrático, ou seja, o governante era um descendente divino. Seus habitantes acreditavam que o deus Sol (Inti) era o ancestral divino dos governantes, além de protetor e incentivador das colheitas.
A religião inca possuía vários rituais e cerimônias – para garantir uma boa safra, curar e prevenir doenças, agradecer realizações dos deuses. Sacrifícios de animais, como lhamas ou cobaias, acompanhavam quase todos os rituais.
Os incas veneravam Viracocha como o grande criador e fonte de todo o poder divino. Adoravam também o Sol (Inti), a Lua (Mamaquilla), o trovão, as estrelas, o tempo, a terra e o mar. Seus sacerdotes usavam a magia para diagnosticar e tratar doenças e fazer previsões e adivinhações.
Arte
Os incas se destacaram por seu trabalho fino em metais e cerâmica, quando comparados a povos anteriores da região. Também desenvolveram uma arquitetura marcante e reconhecível, como mostra o feito da construção de Machu Picchu.
Quipos
A estrutura socioeconômica inca dependia essencialmente da população, pois era uma sociedade organizada na força de trabalho para o cultivo nas lavouras e na criação de animais. Por esse motivo, os incas faziam controles demográficos periódicos.
Para isso, os incas utilizavam os quipos, um sistema numérico próprio que desenvolveram. Consistia em cordões nos quais davam nós e torciam cada qual de uma forma, indicando quantidades numéricas decimais. A altura dos nós nos cordões e as diferentes cores também expressavam informações numéricas específicas.
Quem fazia e conseguia ler as informações que os quipos traziam eram os kipukamayoqs.
Referências
- FAVRE, Henri. A civilização inca. Rio de Janeiro: Zahar, 2004.
- MEGGERS, Betty J. A América pré-histórica. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979.
- MALAMUD, Carlos. Historia de América. Tradução de: LORENZONI, Carla Raqueli Navas; FERNANDES DOS ANJOS, Márcio Raimundo. Madri: Alianza, 2005.
Por: Carlos Artur Matos