Dentre os povos germânicos, o grupo de maior destaque no mundo medieval foi o franco. Os francos dominaram a região da Gália. Conduzidos por Clóvis, o Meroveu, afirmaram a fé cristã em 496.
O Reino franco se tornou o braço armado da Igreja na Idade Média, pois, desde Clóvis, os francos não apenas lutavam por seu reino, mas também em defesa do cristianismo e do papado romano.
Dinastia Merovíngia
Desde o século II os francos vinham invadindo as fronteiras romanas, acabando por ocupar uma pequena porção da Gália. A primeira dinastia dos francos, a merovíngia, deve seu nome a Meroveu, herói franco na batalha dos Campos Catalúnicos contra os hunos de Atila. Contudo foi Clóvis, neto de Meroveu, que, através de campanhas militares vitoriosas, conquistou, na Gália, regiões ocupadas por outros povos bárbaros, anexando-as ao seu vasto território. Em 496, Clóvis converteu-se ao cristianismo, ganhando, assim, o apoio do clero e da maior parte da população da Gália, constituída por cristãos.
A aliança entre Clóvis e a Igreja foi fundamental para a unificação da Gália, na medida em que fortaleceu a autoridade do rei e contribuiu para a fusão entre conquistadores e conquistados. Em contrapartida, o apoio do rei possibilitou à Igreja libertar-se da influência dos imperadores bizantinos e ganhar novos adeptos entre os bárbaros da Europa ocidental.
Durante a dinastia merovíngia, desenvolvia-se o processo de formação do feudalismo, intensificando-se a ruralização e o poder dos grandes proprietários de terras. Como não havia a noção de Estado, de bem público, as terras do reino eram constantemente distribuídas entre o clero e a nobreza, como recompensa por serviços prestados. Assim, a partir de meados do século VII, os reis da dinastia merovíngia foram perdendo autoridade, ficando sujeitos aos senhores feudais. Esses reis são conhecidos como Reis Indolentes, devido à incompetência com que governaram.
Nessa época, o poder foi passando para os prefeitos (ou mordomos) do palácio, verdadeiros primeiros-ministros. Entre eles, destacou-se Carlos Martel, que barrou a expansão dos árabes na Europa, vencendo-os em Poitiers, em 732.
Dinastia Carolíngia
Em 751, o filho de Carlos Martel, Pepino, o Breve, aproveitando-se do prestígio de seu cargo de prefeito e obtendo o apoio papal, depôs o último soberano merovíngio, iniciando a dinastia carolíngia, cujo nome se deve ao seu maior expoente: Carlos Magno. Em retribuição ao apoio do papa, Pepino o apoiou na luta contra os lombardos e cedeu ao papado o território de Ravena, reforçando o poder temporal da Igreja. Os territórios da Igreja, chamados de Patrimônio de São Pedro, deram origem aos Estados Pontifícios, que se mantiveram até o século XIX.
Em 768, Carlos Magno, filho de Pepino, assumiu o trono, governando até 814. Realizou inúmeras guerras de conquista, que expandiram consideravelmente as fronteiras do Reino Franco e garantiram os laços de dependência entre o poder central e a nobreza: parte das terras conquistadas eram doadas à aristocracia, que assumia em troca obrigações e compromissos de lealdade para com o rei-suserano. Assim, embora continuassem a existir as forças de descentralização, devidas à crescente formação dos feudos, foram temporariamente controladas pela forte centralização política de seu governo.
O êxito das campanhas militares de Carlos Magno se deve sobretudo ao apoio da Igreja. Paralelamente à expansão do Reino Franco, efetuou-se a propagação do cristianismo. Com a ampliação de seus domínios, o Reino Franco tornou-se o mais extenso da Europa ocidental, recuperando, em parte, os limites do antigo Império Romano do Ocidente, o que fazia renascer a concepção de império. O papa Leão III, movido por interesses como a difusão do cristianismo e o consequente fortalecimento da Igreja de Roma, coroou Carlos Magno imperador do Novo Império Romano do Ocidente.
O Império Carolíngio organizou-se em unidades político-administrativas chamadas condados e marcas. A maior parte das terras imperiais estava dividida em condados, cujos administradores — os condes — eram diretamente nomeados pelo imperador e a ele ligados pelo juramento de fidelidade. As marcas, unidades de fronteira encarregadas da defesa do império, eram governadas pelos marqueses, que detinham grande poder militar. Havia ainda os barões, que, de seus fortes localizados em pontos estratégicos, auxiliavam na defesa das fronteiras.
Tanto os condados quanto as marcas sujeitavam-se à fiscalização dos missi dominici — os “emissários do senhor” —, funcionários do imperador encarregados de conter os abusos de condes e marqueses e de zelar pela aplicação das leis Capitulares, decretos emitidos em capítulos por Carlos Magno.
O êxito político e administrativo do reinado de Carlos Magno foi acompanhado de grande desenvolvimento cultural, incentivado pelo próprio imperador e denominado Renascimento Carolíngio. Desde o final do Império Romano, a cultura vinha sucumbindo às guerras e aos bárbaros. Pepino, o Breve, não sabia escrever o próprio nome, e Carlos Magno só o aprendeu em idade adulta. A reversão desse quadro passou a ser uma de suas metas. Reuniu sábios, a fim de favorecer a instrução, e, em colaboração com a Igreja, deu novo impulso às letras a às artes, com a fundação de várias escolas, como a Escola Palatina, situada nas dependências do próprio palácio. Nessa escola, dirigida pelo teólogo e pedagogo inglês Alcuíno, ensinava-se gramática, retórica, dialética, aritmética, geometria e música. A efervescência cultural da época possibilitou a preservação de diversas obras da Antiguidade greco-romana, pacientemente copiadas pelos alunos das escolas eclesiásticas.
Divisão do Reino Franco e as invasões bárbaras
Após a morte de Carlos Magno, em 814, o governo passou a seu filho Luís, o Piedoso, que governaria até 841.
Na disputa pela sucessão, seus filhos Lotário, Carlos, o Calvo, e Luís, o Germânico, esgotaram o grande Império em batalhas que só terminariam com o Tratado de Verdun, em 843.
Dividiu-se o Império em três, rompendo-se a unidade imperial conquistada por Carlos Magno.
A Luís coube a chamada França orientai, ou Germânia (atual Alemanha): Carlos herdou a França ocidental (atual França): Lotário recebeu a faixa de terras situada entre esses dois reinos (do centro da atual Itália até o mar do Norte), que passou a se chamar Lotaríngia.
A divisão imposta pelo Tratado de Verdun contribuiu para o enfraquecimento real, favorecendo condes, duques e marqueses, que passaram a ter maior autonomia. Concretizava-se o feudalismo franco, reforçado no século IX por novas invasões bárbaras, que consolidariam definitivamente o feudalismo europeu. Os normandos, ou vikings, procedentes da Escandinávia, penetraram no litoral europeu, fundando na França o pequeno reino da Normandia. Posteriormente, invadiram também a Inglaterra, conquistando-a em 1066.
Outros novos invasores foram os magiares, descendentes dos hunos, que das estepes asiáticas alcançaram a Europa oriental. Surgiram também os árabes, que desde o século VIII haviam fechado o Mediterrâneo ao comércio europeu e que ocuparam a Córsega e a Sicília, de onde organizavam expedições de pilhagem ao sul da Europa.
Desse modo, formava-se a sociedade feudal europeia, num processo que se iniciara com as primeiras invasões bárbaras aos domínios do Império Romano do Ocidente, no século IV, e que se consolidava com as invasões do século IX.
Os reinos originados em Verdun, da fragmentação do Império Carolíngio, seguiram diferentes trajetórias. Em 936, já extinta a dinastia carolíngia, o trono da Germânia foi ocupado por Oto I, ou Otão. Aliando-se à Igreja, Otão buscou a política de centralização do poder. Expandiu para leste as fronteiras de seu reinado, anexando a Lotaríngia à Germânia. Em 962, foi coroado imperador do Ocidente pelo papa João XII, surgindo assim o Sacro Império Romano-Germânico. Após sua morte, em 973, o Império submeteu-se completamente ao feudalismo.
Na França ocidental, os carolíngios enfraqueceram-se tão profundamente após Verdun que, em 987, Hugo Capeto, conde de Paris, encerrou essa dinastia, iniciando uma nova fase da política francesa, típica da Baixa Idade Média.
Por: Paulo Magno da Costa Torres
Veja também:
- A formação dos Reinos Bárbaros
- Invasão do Império Romano
- Povos Germânicos
- História da Igreja Católica e o Cristianismo
- Idade Média