Com um único romance que escreveu aos 21 anos – Memórias de um sargento de milícias – Manuel Antônio de Almeida conquistou na literatura brasileira uma posição também única, fixando a tradição do romance urbano e pressagiando Machado de Assis.
Manuel Antônio de Almeida nasceu no Rio de Janeiro RJ em 17 de novembro de 1831. Órfão de pai aos dez anos, conseguiu diplomar-se em medicina, mas desde cedo, para sobreviver, trabalhou como jornalista. Foi revisor e redator do Correio Mercantil, onde suas Memórias, em forma de folhetins e assinadas sob o pseudônimo de “Um Brasileiro”, saíram originalmente entre 1852 e 1853. Mais tarde, nomeado administrador da Tipografia Nacional, conheceu o ainda aprendiz de tipógrafo Machado de Assis.
Revalorizado pela geração modernista de 1922, o livro de Manuel Antônio é um típico romance picaresco, ou de costumes, ambientado no mundo da baixa classe média carioca sob D. João VI. Mais que o personagem central, o irrequieto e simpático Leonardo Pataca, é esse mundo de comadres e barbeiros, vadios e ingênuos, policiais e espertalhões, que ascende ao primeiro plano como foco e motor da narrativa. Segundo a síntese de Antônio Cândido, “seus personagens-tipos são mais sociais do que psicológicos, definindo antes um modo de existir do que de ser”.
Como em geral acontece em obras similares, a lógica dos acontecimentos se sobrepõe ao destino dos protagonistas para gerar um painel sociológico através de uma sequência de cenas que se encadeiam sem muito rigor. O romance resulta assim de uma justaposição de flagrantes, como se fosse uma movimentada colagem de hilariantes situações do dia-a-dia, narradas de maneira direta e simples, sempre bem-humorada e às vezes francamente caricatural (“O homem era romântico, como se diz hoje, e babão, como se dizia naquele tempo”).
Os homens, basicamente, são sempre os mesmos — parece sugerir essa estrutura de texto — e suas facetas individuais contam menos, para revelá-los, do que o conjunto dos comportamentos em grupo. Um indício claro da postura do autor, a esse respeito, é que muitos personagens de sua galeria de tipos são indicados, não por nomes, mas sim pelo lugar que ocupam ou a função que desempenham no grupo: o “compadre”, a “comadre”, a “cigana”, o “tenente-coronel”, o “fidalgo”, entre outros. Contador talentoso, o autor mostra como a vida social progredia, sempre aproveitando os pretextos para submeter os costumes — as trocas de influência, os pactos de interesse, os desmandos — a uma crítica irreverente e mordaz.
Além de Memórias de um sargento de milícias, publicadas em dois volumes (1854-1855) logo após a serialização em jornal, o autor deixou ainda um drama lírico, Dois amores (1861), e algumas traduções, bem como textos esparsos no Correio Mercantil, recolhidos por Marques Rebelo na Bibliografia de Manuel Antônio de Almeida (1951).
Tentado a ingressar na política, quando exercia o cargo de oficial de secretaria no Ministério da Fazenda, Manuel Antônio de Almeida candidatou-se a deputado provincial, mas morreu no naufrágio do vapor Hermes, perto de Macaé RJ, em 28 de novembro de 1861, quando se dirigia a Campos em viagem de campanha.