Júpiter o filho de Cronos e Réia
Longas insônias viveu Cronos, de olhos pregados no escuro do mundo, à procura de resposta: como evitar que se cumprisse a terrível profecia da mãe Gaia? Como impedir que um dos seus próprios filhos lhe usurpasse o trono?
Depois de muitos planos e tramas, confusão e medo, a resposta fulgurou dentro da noite. Cronos, de um salto, ergueu-se e correu para junto de Réia, sua mulher. Mas não lhe dirigiu palavra alguma. Em silêncio, agarrou seu primeiro filho, que acabara de nascer, e devorou-o. Era o início da sangrenta rotina.
Outras crianças a pobre Réia de à luz, porém a nenhuma teve o prazer de acalentar. Estava cansada. Vivia infeliz. Precisava encontrar uma solução definitiva, para salvar o filho que agora abrigava no ventre. Procurou, pois, a sábia Gaia, e, ajudada por ela, traçou um plano.
Ao chegar o momento do parto, Réia, iludindo a inexorável vigilância do marido, ocultou-se numa distante caverna, nos densos bosques de Creta. Ali, Zeus veio ao mundo.
Enquanto Gaia, a Mãe- Terra, acolhia o menino em seus braços, a deusa retornou ao lar. Vibrava de alegria, mas também de medo: podia falhar a trama tão carregada de esperanças.
O amor pelo filho, entretanto, dominou os receios. Réia apanhou do chão uma pedra, envolveu-a em grossas faixas e entregou-a a Cronos, que, sem perceber o logro, rapidamente a ingeriu. Então a mão de Zeus suspirou aliviada.
Salvara o filho, mas selara a profecia: em dia próximo, o último filho de Cronos tomaria das armas para encerrar o sombrio reinado de sangue. E para sempre se instalar no trono do mundo.
Os dons de Júpiter, pai dos deuses: proteção, disciplina, justiça.
Com relação ao local do nascimento de Zeus (Júpiter) existem duas tradições distintas: a mais corrente refere-se à ilha de Creta: citando especificamente ora o monte Ida, ora o Aégeon, ora o Dicteu. A outra, sustentada pelo poeta Calímaco (IV século a.C.), situa o berço do deus na Arcádia. Ambas, porém, concordam em que a educação de Zeus se realizou em Creta, aos cuidados das Ninfas e dos Curetes, jovens sacerdotes de Réia (Cibele).
Ao crescer, Zeus aliou-se aos irmãos e aos monstros, destronou Cronos (Saturno), venceu os Titãs e os Gigantes. Com a tríplice vitória, firmou-se como senhor absoluto do mundo e encerrou o ciclo das divindades tenebrosas, das forças desordenadas, que, como Cronos – o Tempo – tudo corrompem e destroem. Para os filósofos, seu triunfo simboliza a própria vitória da Ordem e da Razão sobre os instintos e as emoções desenfreadas.
Nas lendas mais antigas, Zeus é descrito como o mais jovem dos crônidas – filhos de Cronos – ao qual, na partilha do mundo, coube o domínio do céu e da terra e a responsabilidade sobre o fenômeno atmosférico. Com a evolução do mito, passa a ser mencionado como primogênito de Cronos; seu poder torna-se absoluto, suas funções ampliam-se.
É ele que “abre aos homens o caminho da razão” e ensina-lhe que o verdadeiro conhecimento só é obtido a partir da dor. Mas não assiste impassível aos sofrimentos humanos; ao contrário, compadece-se e até se magoa por eles. Apenas não se deixa levar pelas emoções, pois é a imagem da justiça e da razão. Sabe que não pode intervir nas descobertas pessoais: cada qual tem de viver sozinho sua própria experiência. Limita-se a premiar os esforços honestos e punir as impiedades.
Por todos esses atributos, Homero (século IX a.C.) chama-o de “pai dos deuses e dos homens”. O termo pai, entretanto, refere-se não a uma relação puramente afetiva, sentimentalmente, e sim a uma relação de poder, de autoridade. Corresponde, na origem, ao pai da família, que provê ao sustento, assegura a proteção e exerce incontestável autoridade sobre seus dependentes.
Com a expansão social e econômico dos gregos, as famílias, que viviam isoladas, agruparam-se em aldeias (demos), depois em cidade, por fim em Estados. A autoridade de cada núcleo familiar continuava exercida pelo pai, mas a este se impunha a soberania do rei, estabelece a disciplina entre os súditos, protege-os, assegura-lhes a ordem, distribui a justiça, comanda e é obedecido.
Ambos os sentido de “pai” conjugam-se em Zeus. Como rei, ele comanda o Olimpo e os homens, e constitui um modelo para os chefes helenos – como afirma Aristóteles (384?-322 a.C.): “A união de um pai com seu filho tem a aparência da realeza. Por isso Homero chama Zeus de pai. É que a realeza quer ser um poder paternal”. E como chefe de família, o deus cada vez mais aumento sua prole, dilatando assim seu pátrio poder. Mais importante que ser fiel a Hera (Juno), sua esposa e irmã, é exercer a paternidade, seja com deusas, seja com mulheres mortais. Todas as regiões e as cidades mais importantes da Grécia vangloriavam-se de Ter como patrono ou fundador um filho de Zeus. Suas uniões são interpretadas de várias formas. A lenda de Dânae, que ele seduziu sob a forma de uma chuva de ouro, foi considerada, por alguns estudiosos, como o símbolo da fecundação da terra pelos raios solares; Eurípedes (480?-406 a.C.), todavia, encara o episódio como uma imagem da soberania da riqueza, que a tudo vence. O rapto de Europa, por outro lado, recebeu uma interpretação histórica uniforme: a donzela fenícia levada para Creta constituiu uma transposição mítica do fenômeno real das migrações que, partido da Ásia, se estabeleceram na ilha de Creta.
Além de pai e chefe, Zeus assumiu também outras funções e diversos epítetos: Zeus Ktésios propiciavam os devotos maiores riquezas; Zeus Herkeios protegia as casas e as cidades; Zeus Xênios velava pelos estrangeiros, pelos desterrados, pelos mendigos, pelos aflitos. Era este Zeus que desaprovava os implacáveis, os desapiedados, os poucos hospitaleiros. Nessa atribuição, Homero louva-o em A Odisseia: “De Zeus poderoso vêm os mendigos e os estrangeiros: embora pequenas, são gratas as dádivas. Ora, criadas, ao hóspede daí o alimento e bebida, e ide banhá-lo no rio, em lugar protegido dos ventos.”
Da Grécia a Roma, o culto do Deus
A imagem mais aceita de Zeus foi esculpida por Fídias (500?-432? a.C.), numa estátua de 13 metros de altura, encomendada para adornar-se o santuário em Olímpia. O deus aparece sentado em um trono de ébano, bronze, marfim e ouro. Tem a fronte adornada por cabelos espessos e ondulados, e cingida pela coroa de ramos de oliveira. O rosto, sereno e majestoso, é emoldurado pela densa barba crespa. Na mão direita, segura a vitória; na esquerda, um certo ensinamento pela águia. Veste um manto de ouro bordado de flores.
O Zeus de Fídias constituiu o tipo ideal no qual se inspiram artistas posteriores, que o retratam geralmente como homem maduro, robusto, majestoso e grave. Quase sempre envolto num grande manto, que deixa descobertos o braço direito e o peito; apenas nas representações primitivas figurava nu.
O deus por excelência, o altíssimo, era cultuado geralmente nos píncaros das montanhas. Ida em Creta, Parnes e Himeto na Ática, Helicão na Beócia, Pélion na Tessália, Pangeu na Trácia, Olimpo na Macedônia, Liceu na Arcádia eram montes que ostentavam templos erguidos em honra a Zeus. O mais antigo santuário, contudo, situava-se em Dorona, no Epiro, onde existia um célebre oráculo do deus.
Levados por viajantes, mercadores e colonos ou pela simples difusão de povoado a povoado, os deuses olímpicos atingiram Roma antes que esta iniciasse a conquista do mundo mediterrâneo. De modo geral ali se identificaram com divindades locais que correspondiam às suas atribuições primitivas. Assim, também Zeus – figura de deus-pai existente em todas as mitologias indo-europeias – identificou-se em Roma com Júpiter, velha divindade do Lácio à qual se consagram os carvalhos do nome Capitólio. Este Júpiter Capitólio deve Ter-se originado de Júpiter Latial, divindade mais antiga, de origem obscura, cujo santuário se encontra nos montes Albanos.
Durante a República Romana, Júpiter era a divindade protetora dos cônsules, que a ele dirigiam preces quando assumiam o poder. Seu culto estava a cargo dos sacerdotes feciais, cuja autoridade suprema era o flamine dialis. O casamento deste com flamínica (sacerdotisa de Juno) simbolizava a união divina de Júpiter e Juno, e não podia ser dissolvido.
Com o advento do Império Romano, Júpiter transfigura-se e passa a encarnar cada vez mais o retrato do imperador. Perde então muito de sua divindade, para transformar-se, na obra de alguns poetas e ceramistas populares, em volúvel perseguidor de ninfas e mortais.
Júpiter luta dez anos pelo poder
Métis, a Prudência, preparou-lhe uma beberagem miraculosa: tão logo ela chegasse às entranhas de Saturno, provocaria ali tal convulsão que o pai voraz se veria obrigado a devolver os filhos engolidos. Pois dentro dele todos estavam vivos, crescidos e adultos.
Levando nas mãos o preciso frasco que a deusa lhe entregara, Júpiter acercou-se do pai e obrigou-o a ingerir a mágica bebida. E tudo aconteceu como dissera Métis. Estremecido por violentos e incontroláveis abalos, Saturno restituiu à luz todas as criaturas que em outros tempos havia devorado. Assim Júpiter conheceu seus irmãos: a loira Ceres, o impetuoso Netuno, a casta Vesta, o taciturno Plutão. Apenas Juno ali não estava, pois, como ele próprio também fora poupada.
A luta começava a configurar-se. Para garantir a vitória, Júpiter desceu aos Infernos e libertou os Ciclopes, forjadores de armas, e os Hecatônquiros de cem braços, monstros que, em sua loucura de poder, Saturno encerrara nas mais escuras profundezas da terra. Depois voltou para a companhia dos irmãos, a fim de tramar planos de batalha, enquanto os Ciclopes se apressavam em fabricar poderosas armas para cada um dos três deuses: o capacete mágico para Plutão, o tridente para Netuno, e o raio para Júpiter.
Longa e árdua foi a guerra. Dez anos decorreram entre os primeiros combates e o glorioso triunfo. Saturno e os Titãs, seus aliados, vencidos pelos deuses irmãos, foram confinados aos Infernos, sob a vigilância dos monstros. Em conferência, os vencedores reuniram-se e dividiram entre si o domínio do mundo. Netuno ganhou a soberania dos mares. Plutão assumiu o reino dos mortos. E Júpiter subiu ao Olimpo para de lá comandar, altíssimo e absoluto, a terra e o céu, os homens e todos os demais deuses.
Mas a Terra estava descontente com o desfecho da luta. Não desejava ela ver prisioneiros seus filhos, os Titãs. Em vão pediu a Júpiter que os libertasse. Recusados todos os seus argumentos, nada lhe restava senão recorrer aos Gigantes. Incitou-os, então, contra o senhor do mundo. Só contribuiu, entretanto, para propiciar ao altíssimo nova vitória.
As desastrosas experiências dos vencidos deveriam ser suficientes para deter as pretensões de novos desafiantes. Mas nem o monstro Tifão – com seus absurdos sonhos de poder – nem os irmãos Aloídas – ardentemente enamorados das deusas Juno e Diana – se deixaram atemorizar pelas lições das derrotas. Cada qual, por seu turno, investiu contra o Olimpo. E cada um, por sua vez, foi arrasado pelo deus.
Reinava a paz no céu e na terra. Júpiter, com suas vitórias sobre as forças da desordem, firmara-se para toda a eternidade como rei supremo, diante do qual todas as vozes humanas e divinas se calavam, com respeito e obediência.
Antíopa – amor e sofrimento
Tarde de verão, em Tebas. O sol cresta as peles banhadas de suor. O trabalho arrasta-se pelos campos em morna lentidão. As plantas nos quintais recusavam-se para o solo ardente, cansada de tanta luz. Pelos atalhos dos bosques, animais e homens procuram o frescor das frondes e o leito ameno da relva. A poucos passos, uma cascata umedece o ar, e pequenas gotas de água, levadas pela aragem, respingam sobre os corpos como bálsamo.
Para as sombras do bosque também se dirigiu a donzela Antíopa, solitária e inocente. Num canto afastado, recolheu-se em seu cansaço. Estendeu-se entre as flores silvestres, e serenamente adormeceu. Os raios do sol, entre as ramagens, formavam desenhos caprichos em seu corpo magnífico.
Júpiter ronda entre as árvores, disfarçado em sátiro. O coração divino suspira, por novas aventuras. Os ouvidos torturados pelos queixumes de Juno anseiam por vozes mansas.
E o deus surpreende Antíopa, adormecida. Estremece de contentamento, ao contemplar as formas perfeitas, os traços delicados, a pele aveludada como o damasco.
Cuidando de não despertá-la, o sátiro ardente acerca-se da jovem e prende-a de súbito em seus braços.
Era tarde demais quando Antíopa despertou, assustada e triste. Só lhe restava ir chorar em terras longínquas a violência sofrida. Pois, ao saber do incidente, Nicteu, seu pai, não lhe pouparia pesado castigo.
Deixando para trás os muros de Tebas, onde vivera feliz desde a infância, a jovem embrenhou-se por escuros atalhos através dos bosques. Preferia morrer nas garras das feras a ser vista por algum pastor ou camponês que certamente levaria a Nicteu a direção de sua fuga.
Depois de muito caminhar entre os perigos, Antíopa foi Ter ao reino de Sícion. Epopeu, o soberano, deslumbrou-se com sua beleza. Hospedou-a em seu palácio e suplicou-lhe que se tornasse sua rainha amada. Afinal brilhavam na vida de Antíopa uma promessa de felicidade. E, em meio a majestosa festa, ela esposou o rei de Sícion.
O tempo de alegria seria breve. Desesperado com a partida da filha, Nicteu, antes de suicidar-se, arrancara de seu irmão Lico o juramento de trazê-la de volta e castigá-la.
À frente de pequena tropa, Lico saiu a investigar sobre o destino da sobrinha, e acabou transpondo as muralhas de Sícion. O ataque transpondo concedeu-lhe fácil vitória, e Antíopa, subitamente viúva, retornou prisioneira para Tebas.
No áspero caminho de volta, a jovem detém a comitiva. Atormentada por fortes dores recosta-se na terra dura e, suplicando a ajuda divina, ali mesmo dá à luz os filhos de Júpiter: Anfião e Zeto. Mas não pode levá-lo consigo. O tio implacável obriga-a a abandonar as crianças, que mais tarde pastores recolheriam.
Passaram-se anos de cativeiro e sofrimento. Presa a fortes correntes, Antíopa vivia apenas de recordações felizes e absurdas esperanças.
Um dos pastores, entretanto, soube da triste vida de Antíopa, e tudo contou aos jovens. Anfião e Zeto rumaram então para Tebas, dispostos a vingar os sofrimentos da mãe.
O primeiro a sucumbir sob as espadas foi o tirano Lico. Depois Dirce, sua mulher, foi atacada à cauda de um touro furioso que os moços soltaram por um caminho de pedras.
Irritado com o suplício infligido a Dirce, sua fiel devota, o deus Baco resolveu intervir. E para punir os jovens castigou-lhes a mãe. Enlouqueceu Antíopa, que saiu a errar pelas terras gregas, sem destino e sem lembranças.
Até que um dia a piedade dos deuses colocou em seu caminho o bondoso Foco, que a curou de sua loucura e a esposou, proporcionando-lhe, afinal, a sonhada felicidade.
Astéria: da ninfa nasce uma ilha
Pela famosa ninfa Astéria suspiravam pastores e camponeses do vale. À porta de sua morada, anonimamente deixavam como oferendas singelos ramos de flores e fartas cestas de frutos. Até os ariscos animais do bosque vinham comer à sua mão, tão grande era o seu encanto.
Beleza alguma sobre a terra podia ocultar-se aos ávidos olhos de Zeus. Por entre as árvores e sob as águas, pelos atalhos e nos templos, andava o deus incansável em busca de formosura. E nessa procura acabou encontrando um dia a doce Astéria.
Como se fosse mortal comum, expressou-lhe seu deslumbramento, e pediu-lhe que retribuísse a seus ardentes desejos. Mas a bela ninfa, sem resposta alguma, pôs-se a fugir pelo vale e pelos bosques.
As folhas das árvores agitaram-se aflitas. Os bichos correram sobre o rastros de Astéria, como para confundir seu perseguidor. Camponeses e pastores suspenderam os trabalhos, para seguir com olhos inquietos e solidários a fuga daquela que os deslumbrava.
Não queria aventuras a casta ninfa. Preferia o silêncio dos oferendas anônimas, o mudo carinho dos animais. Entretanto, as ágeis pernas de Astéria não venciam mais rápido as distâncias que os fortes passos do deus. Era iminente o encontro.
À beira da praia, sem encontrar caminho aberto, a ninfa parou. Ofegante, mas sem medo, resolveu usar seu recurso estremo: pelo poder que recebera dos deuses assumiu forma de pássaro. Tornou-se uma pequenina codorniz.
Não tencionava voar. Ao contrário, olhou mais uma vez para o deus que se avizinhava, e lançou-se ao mar.
E sobre as águas azuis foi perdendo olhos e penas e corpo de ave, para transformar-se ao longe em uma mancha escura, ilha estéril, sem flores e sem frutos. Chamou-se então Ortígia – a ilha dos codornas, seus únicos habitantes. Mais tarde, no entanto, receberia em sua terra seca o deus Apolo e sua irmã Ártemis, e trocaria o nome para Delos. Com isso, se cumularia de riquezas e de glórias.
Egina levada por uma labareda
Um novo amor. Fulminante como o próprio raio de Júpiter. Impetuoso como suas tempestades. Pouco importavam os reclamos da ciumenta Juno, esposa irascível. De nada valiam os frágeis obstáculos erguidos por pais e maridos zelosos. A vontade de um deus não conhece bloqueios em seu caminho.
Esse caminho levava a Egina, jovem filha do rio Asopo. Júpiter queria-a para si. Mas, tal como em outras conquistas amorosas, não tencionava obtê-la por meio da força. Preferia cativá-la com o calor de seu afeto.
À s doces palavras do deus, porém, a ninfa retribuiu com exclamações de medo e aflitos pedidos de socorro. Não havia outro jeito senão adotar um artifício de disfarce e arrebatar a teimosa donzela.
Metamorfoses, Júpiter assumira várias: fora touro e camponês, sátiro e cisne, águia e forasteiro. Precisava inventar uma nova forma. Olhos postos nos leves passos de Egina, durante dias infindáveis pensou na transformação. Finalmente decidido, num fragmento de instante, mudou-se em labareda.
E assim, sob a aparência de chama, desceu para as margens do Asopo e raptou a ninfa. Levou-a em seguida para ilha de Enone, que velhos poetas costumavam também chamar de Enópia. Nas areias desertas, acalentado pelo murmúrio do mar, amou-a impetuosamente.
Se a ninfa, presa no ardor da labareda divina, conseguiu esboçar algum protesto, deve tê-la ouvido o pai Asopo, que, tomado de desespero, mudou o curso de suas águas, atravessou o mar azul e foi até à ilha distante recuperar a filha.
Estava a ponto de alcançá-la, quando Júpiter, irritado com a intromissão, fulminou o velho e obrigou-o a voltar para seu leito de cascalho.
Embora vencido, Asopo, solitário, tramava planos de vingança. Não contra o deus, pois para tanto lhe faltava forças, mas contra a filha, pretendendo ferir indiretamente o senhor do Olimpo.
Júpiter soube das tramas e, para salvar a ninfa de qualquer dano, transformou-a numa ilha, que batizou com o nome de Egina.