Toda língua possui diferenças entre a escrita e a oralidade. Em alguns casos, erros popularizados no falar da língua criam um vício de linguagem. O fenômeno é comum a todos os idiomas e, no português brasileiro, um dos vícios mais comuns na oralidade (às vezes transposto para a escrita) é o chamado gerundismo.
Diferenças linguísticas e de uso da língua tornam esse vício, por exemplo, praticamente inexistente em Portugal ou Angola, onde a forma do gerúndio é pouco utilizada, sendo em geral substituída pelo infinitivo.
As formas nominais
Na Língua Portuguesa, além de todas as conjugações e tempos verbais, um verbo pode apresentar três formas nominais:
- o infinitivo, que apresenta o verbo em potência, exprime a ideia da ação em si de forma indeterminada, como “andar”, “fazer” ou “escrever”.
- o particípio, cujo valor semântico complementa outro verbo ou ação, como um adjetivo ou advérbio, como em “o carro não tem funcionado direito”.
- o gerúndio, que apresenta o processo verbal em ação, e sugere ideia de continuidade e indeterminação temporal, como em “eu sei que estou fazendo errado”.
Quando é empregado incorretamente
O erro é bastante comum na oralidade e algumas áreas profissionais, como vendas e telemarketing, que tornaram o gerundismo célebre e motivo de crítica e piadas. O erro é tão corriqueiro que outras áreas profissionais e mesmo professores de língua portuguesa, por vezes, proíbem funcionários ou alunos da simples utilização do gerúndio – mesmo que em sua forma correta. Então, quando ele está incorreto?
O gerúndio, quando não utilizado para sugerir ideia de continuidade, simultaneidade, repetição ou ênfase de uma ação, deve ser revisto. Em geral, a ação indicada pelo gerúndio decorre “enquanto” outra ação é realizada, ou irá ocorrer em determinada situação, “quando” for estipulado. Exemplos corretos do uso incluem:
“Tendo feito o dever, agora poderá sair com os amigos.”
“Correndo na praça, pensei direito no assunto.”
Quando é empregado corretamente
Não se pode, porém, dizer que toda construção formada por essa estrutura consiste em utilização inadequada do gerúndio. Historicamente, inclusive, o gerúndio já existia em formas aceitas no latim e perdurou até os dias de hoje em formas nominais presentes em todas as línguas românicas. Muitos dos substantivos empregados até mesmo em ocasiões formais, como “formando” ou “educando” para referir-se a alunos e estudantes, têm origem no gerúndio.
Quando a ideia expressa uma ação que ocorre no momento de outra, a locução verbal é adequada, como no seguinte caso: “No momento do jogo, eu vou estar treinando”. Muitas vezes, o gerúndio é um instrumento para criar orações reduzidas, impondo significação e subordinação mesmo sem o uso de conjunções.
Quando o verbo indica ação duradoura ou contínua, a construção com o uso do gerúndio também é adequada:
- Depois de amanhã vai estar ventando.
- Na semana que vem, vou estar trabalhando todos os dias em Campinas.
Referências:
- SERAFIM, Rafael Luz. Do gerúndio ao gerundismo: mudança e preconceito lingüístico. 2008.
Por: Carlos Artur Matos