Auguste Comte (1798-1957) é fundador da física social (a primeira denominação da sociologia) que preocupava-se com a regulação coletiva das sociedades.
Antes mesmo de conhecer seu tutor e principal inspirador, Henry de Saint-Simon, o então jovem Auguste Comte já possuía determinada aversão pelo Antigo Regime e pela forma monárquica de governo, considerada, com o clericalismo, uma instituição social ultrapassada.
Ainda na juventude, quando estudava na Escola Politécnica de Paris, Comte travou contato com os ideais revolucionários e desenvolveu aversão ao governo Bourbon (o qual substituíra Napoleão no comando da França).
A aversão ao clericalismo tornou-se mais clara quando Comte voltou-se para o estudo dos avanços tecnológicos do período, maravilhado com as descobertas e benefícios trazidos pela pesquisa científica.
Pensamento de Auguste Comte
Para Comte, a crença e a permanência dos dogmas seriam obstáculos ao progresso do conhecimento humano. Esse progresso somente seria possível com a promoção do desenvolvimento científico e a aceitação das mudanças promovidas por ele em toda a Europa.
Assim, o cientificismo torna-se o cerne do pensamento comteano, obcecado em produzir nas ciências humanas os mesmos resultados e eficiência que os métodos científicos geraram nas ciências exatas e biológicas.
Esses métodos seriam os principais responsáveis pelo distanciamento da visão religiosa e pela crença comteana de que a Revolução de 1789 precisava ser concluída. Tal conclusão apenas seria possível com a industrialização da França, levando-a em direção a uma modernização social, fruto da aplicação de uma ciência humana positiva.
Eis aí o grande desafio de Comte: projetar uma ciência social que tivesse a mesma eficiência das ciências naturais e que permitisse compreender e direcionar o desenvolvimento progressivo do homem em direção à civilização, entendida como uma sociedade industrializada, em que cada homem livre pudesse cumprir sua função social.
Comte e a física social
Comte considerava ser necessário introduzir o método de estudo das ciências naturais em uma ciência humana que pretendesse compreender as relações sociais. Como Kant na filosofia, procurou superar o conflito existente entre empiristas e racionalistas do século XVII, com a diferença de que, no seu caso, a superação de tal conflito se deu de forma prática.
Para o sociólogo, não há sentido se o conhecimento não puder ser observado exatamente como se manifesta na realidade: não há distinção entre realidade prática e as ciências abstratas que utilizam o pensamento metafísico para compreender essa realidade imediata. Um deve ser necessariamente igual ao outro sem quaisquer diferenças.
Tal princípio levaria Comte a afirmar a necessária neutralidade do pesquisador diante dos acontecimentos sociais, possibilitando-lhe compreender as relações sociais e a sociedade. Essa forma de conhecimento (ou ciência) foi denominada por Comte como física social e, posteriormente, sociologia.
A física social, dessa forma, seria a “ponta da pirâmide”, a ciência responsável por organizar as demais ciências naturais, relacionando-as e utilizando os mesmos métodos destas, de modo a não apenas se especializar em sua área, mas também a ser responsável pelo sentido maior do conhecimento.
As reflexões de Comte se fundam na desagregação moral – provocada, segundo ele, pelos processos revolucionários – e no desejo prático para superação dessa crise com base na construção de uma nova coesão de pensamento capaz de reconstituir a ordem. Nesse sentido, ele propõe que a física social (a sociologia) deveria oferecer elementos morais para formação da nova ordem burguesa, para que o curso da sociedade industrial se reajustasse na direção correta.
A física social, ao estudar e explicar as leis que regem o mundo social, utilizando, para tanto, métodos similares aos das ciências naturais, poderia intervir nos fatos da sociedade (sociologia como ciência prática) e ser o elo científico que ligaria a ordem da sociedade ao progresso em curso contínuo.
A especialização era vista por Comte como uma das grandes inovações científicas do período, resultante da influência da divisão técnica do trabalho, que também obteria resultados impressionantes na linha de produção; por outro lado, a liberdade, inicialmente defendida na juventude, tendia a ser substituída por certa obediência necessária para o sucesso da ciência positiva, afinal era preciso que cada indivíduo estivesse ciente de suas funções dentro da sociedade.
Sob essas percepções, Comte tratou de desenvolver seu pensamento, aplicando-o às sociedades em geral. O sociólogo afirmou a existência de estágios de desenvolvimento como se as sociedades evoluíssem de modo análogo aos organismos vivos. Essa visão se aproxima – em outro contexto – das ideias de Charles Darwin (1809-1882), cujas concepções também abalaram os alicerces do clericalismo e da concepção divina da vida.
Dessa maneira, nada mais natural que Comte possuísse enorme admiração pela biologia que, com a matemática, era considerada uma ciência positiva por excelência, novamente pela eficiente metodologia de estudo incorporada, pautada na observação, comparação, experimentação e classificação dos objetos dispostos na natureza.
Assim, a proximidade com as ciências biológicas levaria Comte a desenvolver sua teoria dos três estágios (ou teoria dos três estados). Essa abordagem do desenvolvimento das sociedades foi (e ainda é, de certa forma) usada como justificativa pelas nações mais industrializadas para dominar, explorar e retirar as riquezas de sociedades menos desenvolvidas (do ponto de vista tecnológico) sob o argumento de levar a elas o “ideal civilizacional”.