Nascido em Cantagalo, Rio de Janeiro, Euclides da Cunha tornou-se ferrenho abolicionista e republicano. Foi expulso em 1888 da Escola Militar da Praia Vermelha porque ofendeu o ministro da Guerra do Império.
Em São Paulo, Euclides passou a escrever para o jornal A Província de São Paulo (que se chamaria O Estado de S. Paulo a partir de 1889). Depois da proclamação da República, reintegrou-se ao Exército. Em 1896, deixou a vida militar e passou a dedicar-se ao jornalismo e ao funcionalismo público, como engenheiro e diplomata.
O seu sucesso com Os Sertões e como homem público e culto não se repetiu na vida pessoal de Euclides da Cunha: morreu de forma patética, em um duelo com o amante de sua esposa.
Sua obra que interessa à Literatura é mesmo Os Sertões (1902). Além dessa, escreveu tratados sociológicos e diplomáticos sobre problemas brasileiros e latino-americanos.
Partindo das teorias positivistas e deterministas de Auguste Comte e Hippolyte Taine, e ultrapassando-as, Euclides da Cunha construiu uma das obras mais originais da nossa prosa. Dividiu-a em três partes, segundo os pressupostos do determinismo: os acontecimentos sociais são sempre determinados por três fatores — meio, raça e momento. Assim:
1- parte: “A terra” [o meio] – descrição detalhada dos aspectos geofísicos do Brasil, com destaque para a região agreste do nordeste do país, onde se desenvolveram as batalhas de Canudos; destaca-se ainda o estudo do fenômeno cíclico das secas.
2- parte: “O homem” [a raça] – apresentação do homem regional nordestino que habita o meio agreste, mostrando sua capacidade de resistência às agruras da vida e do meio em que vive (o homem é resistente e rude como o meio agreste em que vive). Destaca-se a figura de Antônio Conselheiro, o líder messiânico em torno de quem se formou a comunidade de Canudos.
3- parte: “A luta” [o momento histórico] – relato da Campanha de Canudos, desde os primeiros conflitos (uma troca de tiros entre policiais e habitantes de Canudos, no momento de entrega de rifles comprados por estes numa pequena cidade baiana) até a destruição completa do arraial de Canudos pelas forças do exército republicano (1897). Nessa parte, Euclides deixa claro que o país seguia um rumo e os excluídos do sertão, ignorados pelas elites políticas e pela república, seguiam um rumo distinto, recusando o novo regime e sonhando ainda com um Imperador. O autor nos mostra ainda a ferocidade de brasileiros contra brasileiros, a ignorância tanto da elite quanto dos sertanejos. Mostra, enfim, que meios e homens distintos determinam reações, anseios, ideologias e necessidades distintas.
Euclides da Cunha teve um contato pessoal com o final do conflito, pois foi enviado como jornalista correspondente especial de O Estado de S. Paulo para a região. Antes de viajar para a Bahia, Euclides já havia escrito dois artigos sobre a Guerra de Canudos, nos quais manifestava, fazendo coro com a opinião nacional, repúdio aos sertanejos monarquistas. A visão in loco da situação dos sertanejos os e dos motivos e encaminhamentos do conflito o fez mudar drasticamente de opinião. O fato de Euclides da Cunha presenciar o final do massacre foi o que deu ânimo ao autor de produzir uma das mais contundentes e emocionadas denúncias sobre a ignorância e a miséria humanas produzidas por um governo poderosamente ignorante.
Por: Renan Roberto Bardine