Uma metafísica dos costumes é indispensável, pois os costumes encontram-se suscetíveis à corrupção. Não basta que uma lei moral venha nos dizer o que é moralmente bom ou ruim, mas que traga em si uma necessidade absoluta dos homens, que a faça ser respeitada por si mesma.
Capítulo Primeiro: Transição do conhecimento vulgar da razão ao conhecimento filosófico
Não há nada que seja sempre bom em qualquer situação, a não ser uma boa vontade, e que esta não seja boa pela utilidade que tem, mas sim que seja boa por si mesma. A razão não deve nos dirigir na satisfação de nossas necessidades, mas deve criar uma vontade boa em si mesma, sendo por isso, absolutamente necessária.
Uma ação feita por dever não tem seu valor moral na sua utilidade, mas na lei que impulsiona a ação. O dever somente deve ser impulsionado pela lei, devendo-se descartar qualquer sinal de vontade própria, guiada pelo que se ganha no cumprimento do dever.
Para sabermos se uma vontade é moralmente boa, devemos nos perguntar se desejamos que essa máxima se converta em lei universal, caso contrário é reprovável. É reprovável não por não atender às vontades de alguém ou por fazer mal a alguém, mas por não poder ser generalizada. Diante dessa vontade de se satisfazer e da lei moral, cria-se uma dialética natural entre as partes que discute as leis morais do dever.
Capítulo Segundo: Transição da filosofia moral popular à metafísica
Transição da filosofia moral popular à metafísica dos costumes
Apesar de o homem agir impulsionado pelo dever, sempre resta a dúvida se não existem realmente interferências das inclinações, das vontades pessoais. Por esse motivo ao longo da história sempre se colocou em dúvida a existência de qualquer ação que fosse guiada pelo dever, mas mesmo assim – durante o passar dos tempos – o conceito de moral não foi colocado em dúvida, digna de conceber a ideia de dever e débil para cumpri-la e empregando a razão para administrar as inclinações.
É impossível determinar com certeza um caso em que o dever tenha sido a única causa impulsora de uma ação, pois se tratando de valores morais, não importam as ações, mas sim seus princípios que não se encontram aparentes, mas escondidos no profundo do ser.
Observando-se as ações humanas, deparamo-nos continuamente com interferências dos interesses pessoais. Para impedir que venhamos perder completamente a fé em nossas convicções do dever, devemos ter em mente que não importa que nunca tenha havido uma única ação de acordo com o dever, mas importa que a razão – anteriormente a toda e qualquer experiência – ordena o que se deve fazer.
Nenhuma experiência empírica é capaz de nos dar semelhante lei evidente, pois todo exemplo de ação moral é julgada primeiramente pela noção a priori de moralidade. Não há duvida se é ou não bom alcançar esses conceitos completamente livres de empirismos; na época presente podem ser necessários.
Uma filosofia pratica popular é admissível quando fundamentada primeiramente nos conceitos da razão pura. Não sendo nesse caso, torna-se uma mescla de más observações e princípios ruins, sem que ninguém se pergunte se a fonte para os princípios devem ser de origem empírica ou racional. É demonstrável então que os conceitos morais devem derivar única e exclusivamente da razão pura.
A vontade geral prefere uma filosofia prática popular a um conhecimento racional puro. Mas deve-se primeiro alicerçar tal teoria na metafísica e só então procura-se a popularidade.
Mas a metafísica dos costumes não é só o meio onde ocorre todo o conhecimento teórico, devido ao fato de que a representação pura do dever sobre o coração humano uma reação tão mais forte que todas as teorias empíricas torna-se soberana. Por outro lado uma teoria moral misturada a conclusões empíricas não consegue conduzir a uma boa vontade, ou conduz ao mal.
Conclui-se que todos os conceitos morais têm sua base e origem completamente a priori, na razão pura. A aspiração que é guiada pela razão denomina-se razão prática. Mas se a ação é determinada por outros fatores alem da razão, é denominada contingente. Se for determinada apenas pela razão, é constrição.
Os imperativos são meios de se exprimir a relação entre as leis e as imperfeições da vontade guiada pela lei. O imperativo hipotético ocorre quando ação é boa somente como meio para se chegar a determinado fim. É imperativo categórico se a ação é representada como boa por si mesma.
O imperativo da habilidade diz o que se deve fazer para se chegara um fim sem se importar se esse fim é bom ou ruim. O imperativo da moralidade não se refere à matéria da ação e do que dela resulta, mas à forma e ao princípio onde ela resulta. O imperativo categórico é o único que se expressa em lei prática, os demais podem chamar-se princípios, mas não leis da vontade. Algo que é necessário somente como meio a um determinado fim é contingente (descartável), pois podemos renunciar ao propósito, e o mandato incondicionado não possui em si a necessidade.
Concluímos que se o dever necessita influenciar nossas ações práticas, então somente pode ser expressa através de imperativos categóricos e de modo algum através de imperativos hipotéticos. O que deriva de sentimentos e tendências humanas pode nos dar uma máxima, mas não uma lei, ou seja, não no o briga a agir.
O homem existe como um fim em si e não como um meio de alcançar este ou aquele objetivo. Tudo o que podemos obter por meio de nossas ações possui um valor condicionado. Se existir um imperativo categórico, deverá pela representação do que é fim afirmar o que é fim para todos já que é fim em si mesmo. O fundamento deste princípio é: a natureza racional existe como um fim em si mesmo. O imperativo prático será então: “age de tal modo que possas usar a humanidade, tanto em tua pessoa como na pessoa de qualquer outro, sempre como um fim ao mesmo tempo, e nunca como um meio”. O dever há de ser sempre condicionado e nunca servir para o mandato moral, sendo este princípio chamado de o da autonomia da vontade em oposição a heteronomia.
Autonomia da Vontade Como Princípio Supremo da Moralidade
A parte da vontade que constitui uma ordem a si mesma é a autonomia da vontade, independentemente dos objetos que possa fazer parte da vontade. O princípio da autonomia é que as suas máximas venham a valer para todos.
A Heteronomia da Vontade Como Origem de Todos os Princípios ilegítimos da Moralidade
Quando a vontade procura a lei que deve determiná-la em outro ponto que não o de suas máximas, mas sim de seus objetos então se constitui a heteronomia. Nesse caso é o objeto de desejo da vontade que determina as leis. A heteronomia é o oposto do imperativo categórico, sendo que a heteronomia afirma que se deve fazer algo com um propósito e o imperativo categórico diz o que se deve fazer independente dos objetos do desejo.
Capítulo Terceiro: Última transição da metafísica do costumes a critica da razão pura prática
O conceito de liberdade constitui a chave explicativa da autonomia da vontade.
A vontade é uma espécie de destino dos seres racionais, sendo que estes se tornam livres quando escolhem a lei moral que irá reger as suas vidas. A liberdade da vontade somente pode ser a autonomia.
A liberdade como propriedade da vontade deve pressupor-se em todos os seres racionais.
Como a vontade somente é livre se debaixo da lei moral, deve ser atribuída a todos os seres racionais.
Do interesse que assenta nas ideias da moralidade
Não se pode saber como as coisas são realmente, ou em si; somente posso saber como as coisas se apresentam a mim. Por isso não é aceitável que o homem pretenda conhecer-se a si mesmo tal como é, pois o conhecimento que possui de si deriva apenas do mundo empírico, sendo então digno de desconfiança. O ser humano possui uma parte racional e outra empírica.
Referência Bibliográfica:
KANT, Emmanuel. Fundamentos da Metafísica dos Costumes. Trad. de Lourival de Queiroz Henkel. São Paulo: Ediouro.
Autoria: Suelem Cabral Valadão
Veja também:
- O que é Metafísica
- Metafísica de Aristóteles
- Humanismo: fundamentos, filosofia e pensamentos
- Realismo e Naturalismo
- Ciência Mito e Filosofia
- John Locke