Entre os anos de 1912 e 1916, uma movimentação social muito parecida com a Guerra de Canudos se desenvolveu no Sul do Brasil e ficou conhecido como Guerra do Contestado.
Causas do conflito
A guerra começou no período do Império com a disputa de uma região pelas províncias de Santa Catarina e Paraná, daí o termo contestado.
Essa região era rica em madeira e erva-mate, por isso foi palco de diversas disputas:
- Os coronéis queriam integrá-la ao seu território para ampliar suas terras;
- Empresas modernas e estrangeiras, como a Southem Lumber and Colonization, obtiveram autorização para explorar madeira da região;
- A construção da estrada de ferro Madeira-Mamoré expulsou das terras diversas famílias e posseiros que ali viviam, entre outros conflitos.
Muitos posseiros foram expulsos e passaram a vagar pelas zonas rurais, formando pequenas comunidades chefiadas por líderes religiosos.
As elites locais, temendo o fortalecimento desses grupos, pediam a intervenção dos governos estaduais. Quando um desses povoados era destruído, outro ressurgia em seu lugar.
O líder
Nessas condições sociais surgiu, em novembro de 1911, em Palmas, um homem barbudo e cabeludo que se dizia herdeiro espiritual do beato João Maria e se chamava Monge José Maria.
Fanático por novelas de cavalaria medieval, o “monge” José Maria inspirava-se no livro História de Carlos Magno e dos Doze Pares de França, que ele considerava tão sagrado quanto a Bíblia.
Formou uma espécie de governo celestial dotado de ministério e de adolescentes virgens, simbolizando a inocência e a pureza. Além de milhares de seguidores, José Maria recebeu apoio do coronel Henriquinho de Almeida, plantador de erva-mate e inimigo feroz de outro coronel, Francisco de Albuquerque.
A rápida expansão do movimento chamou a atenção do governo, que acabou prendendo alguns adeptos de José Maria, e, como castigo, raspou-lhes a cabeça. Em solidariedade, os demais também rasparam a cabeça e passaram a ser chamados de “pelados”, enquanto eles chamavam os militares de “peludos”.
Os rebeldes reivindicavam a posse das terras desapropriadas pela ferrovia, acusavam a República por todos os males causados e apresentavam caráter messiânico.
As fases da Guerra do Contestado
Para o governo, as denúncias contra o governo republicano foram interpretadas como um movimento monarquista. O governo investiu com grande aparato militar e, no primeiro confronto, José Maria foi morto.
Seus seguidores continuaram a luta acreditando em sua ressurreição. A liderança rebelde passou para as “virgens”, entre as quais se destacou Maria Rosa, com 15 anos de idade, responsável pela criação de várias comunidades de crentes que lutavam contra as forças do governo.
Em 1913, em Curitibanos, os conflitos políticos locais reapareceram. Nesse mesmo período, surgiu a lenda do regresso de José Maria e do início próximo da Guerra de São Sebastião (rei português, desaparecido em combate), envolvendo um exército encantado, defensor dos camponeses contra as forças inimigas e contrárias aos sertanejos.
Conta-se que José Maria começou a aparecer em visões para uma menina em Taquaruçu, ordenando a mobilização dos fiéis e desencadeando o deslocamento de centenas de sertanejos que seguiam em romaria para o local.
O prefeito de Curitibanos denunciou ao governo federal a formação de um movimento monárquico em Taquaruçu. Forças do Exército, da Polícia Militar e civis iniciam o ataque aos sertanejos, que resistiram.
Dispersos ao longo da região do Contestado e formando vilas santas, os camponeses empregavam a técnica de guerrilha, reunindo-se posteriormente numa enorme cidade santa, Santa Maria.
Consequências
Em 1914, o governo resolveu acabar de vez com a chamada Guerra Santa do Contestado, enviando um imenso contingente armado com canhões modernos e aviões como instrumento bélico sobre as comunidades e os acampamentos rebeldes.
Em 1916, a Guerra do Contestado, ou Guerra dos Pelados, chegou ao fim, com a morte de 20 mil pessoas.
A guerra durou quatro anos, terminando com o massacre dos caboclos que lutavam por terras na região limítrofe entre os estados de Santa Catarina e Paraná.
Conclusão
Mais que uma disputa entre autoridades e lideranças populares, pode-se entender a Guerra do Contestado como o resultado do abuso dos “donos do poder”, do interesse econômico e da opressão que invariavelmente atingia a população sertaneja.
Os sertanejos se apossavam de terras para subsistir fora do universo de poder dos latifundiários, no entanto os interesses despertados pelos espaços ocupados eram logo instrumentalizados em ações do poder público contra a população pobre e sertaneja.
Por: Alinne Mayte Terhost