O período joanino caracterizou-se pelo esforço da Coroa Portuguesa no sentido de estabelecer um equilíbrio entre os interesses dos grandes proprietários de terras brasileiros e os dos comerciantes. Alguns estancos foram mantidos para satisfazerem estes últimos. Estabeleceram-se impostos pesados e progressivos, necessários à manutenção do luxo da Corte.
Para evitar incompatibilidades, foram concedidos à aristocracia rural alguns privilégios fiscais. O absolutismo permaneceu em vigor, mas sempre fazendo concessões aos senhores de terra que eram atraídos para a Corte através da outorga de títulos.
A estrutura colonial aniquilara a vida cultural do Brasil. Inexistiam as preocupações com a educação e saúde pública; as academias filosóficas, literárias e científicas estavam desamparadas; as bibliotecas não haviam sido formadas pois eram consideradas perniciosas; a publicação de jornais era proibida. O Príncipe-Regente, influenciado por seus ministros, deu início a várias reformas nesse setor.
As primeiras providências de dom João
Com a vinda da família real de Portugal para o Brasil, em 1808, a colônia se tornou sede da monarquia portuguesa, e sua situação político-econômica logo se modificou. Em 28 de janeiro, dias após a sua chegada, o príncipe regente dom João assinou o Decreto de Abertura dos Portos Brasileiros às Nações Amigas. Além de liberar os portos para o comércio internacional, esse decreto marcou o fim do pacto colonial, extinguindo o monopólio comercial lusitano, ou seja, a obrigação de o Brasil comerciar exclusivamente com Portugal, inaugurando o início do domínio inglês.
A transferência da família e da corte portuguesa para o Brasil, no início do século XIX, deflagrou ainda um conjunto de transformações as quais, segundo vários historiadores, significaram o fim do período colonial. Os estudiosos chegam a afirmar que houve um “novo descobrimento” do território e que o Rio de Janeiro se tomou palco de um “processo dvilizatório”, visto que ocorreu uma verdadeira “interiorização” da metrópole portuguesa.
Tratados comerciais do período joanino
Entre as várias mudanças desencadeadas pela presença da família real no Brasil, merece destaque o fim do monopólio exercido pelos comerciantes portugueses, em decorrência da carta régia de Abertura dos Portos de 1808 e dos Tratados de Aliança e Amizade e de Comércio e Navegação, firmados com a Inglaterra em 1810. Tais tratados asseguravam privilégios ao governo e aos súditos ingleses.
Entre os privilégios destacava-se o estabelecimento de tarifas preferenciais (15% sobre o valor da mercadoria) para os produtos ingleses, o que contrastava com as tarifas pagas pelos produtos vindos de Portugal (16%) e dos demais países (24%). Assim, na prática, o monopólio do comércio da colônia, que fora exercido pelos comerciantes portugueses até 1808, com a abertura dos portos passou a ser exercido pelos comerciantes ingleses.
Aparelho burocrático do período joanino
Grande parte do aparelho burocrático do Estado português foi remontada no Brasil. Para organizar as finanças e fazer frente às novas despesas, foi criado, em 1808, o Banco do Brasil. Sua função principal era obter fundos para cobrir os pesados gastos da corte, além de realizar transações comerciais.
Instalaram-se ainda o Erário [tesouro] Régio, depois transformado em Ministério da Fazenda; o Conselho de Estado; a Junta de Comércio; a Intendência [administração] Geral da Polícia; as Mesas do Desembargo do Paço e da Consciência e Ordens (ou tribunal); a Casa da Suplicação (órgão ligado ao poder judiciário) e a Junta Real de Agricultura e Navegação.
Política externa e cultural do período joanino
No cenário externo, a conquista da Guiana Francesa (1809) e a invasão da Província Cisplatina (1817), atual Uruguai, significaram uma represália do governo joanino à invasão de Portugal pelas tropas francesas e espanholas, respectivamente.
No plano cultural, a presença da coroa portuguesa efetivou uma série de transformações no território brasileiro: a instalação da Imprensa Régia (ou oficial) e a publicação da Gazeta do Rio de Janeiro, primeiro jornal a circular na América portuguesa; a fundação de cursos superiores de Medicina e de escolas de formação de oficiais militares; a criação do Jardim Botânico e da Biblioteca Real; e a vinda das missões artísticas estrangeiras, a partir de 1816.
Rio de Janeiro: a nova capital do Império Luso
A chegada da corte ao Rio de Janeiro gerou, num primeiro momento, uma série de conflitos com a população local.
A capital colonial era uma cidade pequena para acomodar repentinamente o séquito real. Para resolver o problema, os funcionários reais recorreram até mesmo à violência, obrigando os moradores das melhores casas a abandoná-las. A senha P.R. (Príncipe Regente), inscrita nas casas escolhidas, passou a significar “ponha-se na rua!”.
A chegada da corte ainda trouxe outros conflitos para a sociedade. Muitos dos brasileiros passaram a adotar a moda europeia, com roupas incompatíveis com o clima e com o estilo de vida dos colonos. A abertura dos portos para os produtos ingleses também trouxe uma série de novidades, mas sem nenhuma utilidade, tais como patins de gelo.
Apesar das dificuldades iniciais, a instalação da corte no Rio de Janeiro dinamizou a sociedade, a economia e a cultura, dando ares metropolitanos à nova capital do Império Luso: em 1815, o Brasil foi elevado à condição de Reino Unido a Portugal e Algarves.
Tal medida foi tomada em razão das pressões para que dom João retomasse a Portugal. Segundo determinação do Congresso de Viena (que se ocupou da reorganização política e territorial da Europa depois da queda de Napoleão), um Estado só poderia ser governado da metrópole, nunca da colônia. Na condição de reino, o Brasil deixava de ser colônia, e dom João podia permanecer aqui, tendo sido aclamado rei em 1818, com o título de dom João VI.
O período joanino: contratempos no Brasil
No Brasil, várias províncias, como a de Pernambuco, passaram a se queixar de merecerem a atenção do governo somente por ocasião do lançamento de novos impostos, ressentindo-se da posição ocupada pelo Rio de Janeiro.
A Insurreição Pernambucana de 1817 teve importante papel na luta pela emancipação política. Na raiz desse movimento, estavam a crise econômica em que vivia a região, esquecida pela administração joanina, e o espírito republicano separatista nordestino.
A carga tributária exagerada para sustentar a corte portuguesa, os prejuízos dos grandes proprietários de terras em virtude de uma grande seca e a miséria da população estimularam a elite pernambucana, o clero, os comerciantes e as camadas populares a querer o desligamento de Portugal. Os revoltosos tinham por ideal a independência do Brasil, a proclamação de uma República federativa e a promulgação da Constituição.
O governo reprimiu o movimento violentamente. Apesar do fracasso, a Insurreição Pernambucana deixou claro que a independência do Brasil era uma questão de tempo.
O período joanino: contratempos em Portugal
A Revolução Liberal de 1820, na cidade do Porto, em Portugal, foi um movimento burguês que exigia o retorno da família real. Os revoltosos propunham a elaboração de uma Constituição que limitasse o poder do monarca e defendiam a volta do Brasil à situação de colônia.
Pressionado, dom João VI passou o trono brasileiro a seu filho, Pedro, na qualidade de príncipe regente, e embarcou de volta para Lisboa, em 1821. Ao chegar, teve seus poderes limitados pela Constituição elaborada pelos políticos liberais do Porto. Na prática, o Parlamento passou a governar Portugal.
Por: Renan Bardine
Veja também:
- A Regência de D. Pedro
- Vinda da Família Real ao Brasil
- A corte portuguesa no Brasil e a ruptura do pacto colonial
- Tratados de 1810
- Crise do Sistema Colonial
- Independência do Brasil