Após a Revolução de 1930, os militares entregaram o poder a Getúlio Vargas, nome até hoje lembrado e associado ao nacionalismo econômico e ao trabalhismo.
O maior fenômeno político da Era Vargas será o novo tipo de Estado que se estruturará nessa fase de transição de economia agrária para industrial: o chamado Estado de massas ou populismo, um tipo de Estado que pretendia se situar acima dos interesses de classes.
O Brasil, país predominantemente agrário-exportador, iniciou a transição para uma economia industrial e uma sociedade urbana. Os reflexos dessa transformação foram os conflitos entre os diversos segmentos sociais, dos alijados do poder às novas classes em ascensão e/ou em formação.
O Governo Provisório (1930-1934)
Getúlio Vargas inaugurou esse Estado, adotando a prática de imobilizar as várias tendências sociais que poderiam atentar contra o governo recém-instituído. Fez-se, então, uma composição de medidas que, de um lado, fomentaria a economia estagnada pela Crise de 1929 e, de outro, atenderia às várias expectativas criadas em torno de seu governo.
Entre as medidas iniciais do Governo Provisório, pode-se destacar a compra e destruição dos estoques de café, pretendendo com isso melhorar os preços do principal produto brasileiro. A ideia era irradiar, com essa ação, benefícios para a vasta cadeia econômica que se articulava à cafeicultura. Além disso, em 1933, Vargas reduziu à metade a dívida dos cafeicultores com o governo, sendo renegociada, também, a dívida brasileira com os credores.
Para baixar os preços dos alimentos, foi estimulada a policultura e criaram-se institutos voltados a determinados produtos também considerados importantes para a economia nacional, tais como o Conselho Nacional do Café (1931), o Instituto do Cacau (1932) e o Instituto do Açúcar e do Álcool (1933).
O intervencionismo estatal na economia ainda esteve presente na indústria: o governo procurou estimular o desenvolvimento industrial. Com este intuito, elevaram-se as taxas de importação, as taxas de juros e a desvalorização cambial, adotando-se, também, medidas de caráter nacionalista e de controle sobre preços e salários.
As medidas governamentais não se circunscreveram à economia, abrangendo também o plano político. A Constituição de 1891 foi anulada e Vargas passou a governar por decretos: houve nomeação de interventores para os estados (muitos eram tenentes), foi reforçado o Poder Executivo federal, criando-se ministérios voltados a questões estratégicas e sociais, tais como o Ministério de Educação e Saúde Pública e o Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio, em 26 de novembro de 1930.
Algumas dessas ações foram questionadas, mas a mais debatida dizia respeito a governar por meio de decretos e intervenções nos estados. A oligarquia paulista iniciou uma campanha exigindo uma nova constituição para o país. Como Vargas demorava em sinalizar que faria isso, as conspirações contra seu governo começaram a se articular tendo por base o estado de São Paulo na Revolução Constitucionalista de 1932.
A Constituição de 1934
A Constituição de 1934, a segunda republicana, promulgada em 15 de julho de 1934, manteve o Brasil como uma república federativa, presidencialista e representativa.
No entanto, novidades foram apresentadas tais como o voto secreto, excluindo os analfabetos (2/3 da população), estendendo-o às mulheres. Além disso, uma outra novidade foi a representação classista, inspirada no fascismo italiano, sendo eleitos para a Câmara de Deputados representantes dos sindicatos patronais e dos trabalhadores, tutelados pelo governo. Isso mostrava uma preocupação de Vargas, qual seja, manter sob tutela o movimento operário, canalizando as reivindicações operárias para a esfera do governo.
A relação entre o governo e o operariado passou a ser mediada por órgãos oficiais como o Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio, as Juntas de Conciliação e Julgamento – existentes até os dias de hoje, conciliando ações trabalhistas. Regulamentaram-se a jornada de trabalho para 48 horas semanais, o direito ao descanso semanal remunerado (domingo), o trabalho feminino e infantil, os sindicatos e foram criados Institutos de Pensão e Aposentadoria.
Ficou decidido que a primeira eleição para a presidência seria indireta, sendo eleito Getúlio Vargas. Assim, iniciava-se uma nova fase da Era Vargas, a Constitucional.
O Governo Constitucional de Vargas (1934-1937)
Vargas, eleito de forma indireta pelo Congresso, permaneceria no poder para um mandato de quatro anos. Durante esse período, o destaque foi para as duas alianças políticas que se formaram no país, de tendências antagônicas.
A AIB (Ação Integralista Brasileira), de tendência fascista, fundada pelo escritor Plínio Salgado em 1932 (com o apoio do Partido Fascista Brasileiro, fundado em 1928), defendia um regime político ditatorial, antiliberal e antidemocrático, nacionalista e anticomunista, a exemplo dos fascismos italiano e alemão. Preocupada com a luta de classes, a AIB defendia que uma elite esclarecida conduzisse o processo político e que o Estado intercedesse nos conflitos de classes (corporativismo).
Sua atuação teve apoio entre os elementos empobrecidos da classe média (setores mais conservadores da sociedade). O seu lema era “Deus, Pátria e Família”.
A ANL (Aliança Nacional Libertadora) foi o primeiro movimento de massas no país. A ANL não deve ser considerada um partido, mas, a exemplo das frentes populares antifascistas e anti-imperialistas europeias, uma frente de oposição, uma aliança de diversos setores políticos com fins em comum, aglutinando ex-tenentes reformistas e esquerdizantes, liberais, comunistas, socialistas e líderes sindicais.
O presidente da ANL era o capitão Hercolino Cascardo (participante da Revolta Tenentista de 1924) e o presidente de honra, Luís Carlos Prestes, do Partido Comunista Brasileiro.
Entre suas propostas estavam: suspensão definitiva do pagamento da dívida externa brasileira; nacionalização de empresas estrangeiras; reforma agrária e proteção para os pequenos proprietários; instauração de um governo popular.
Pode-se verificar que não havia um caráter socialista em suas propostas, mas uma tendência nacionalista e anti-imperialista, de caráter popular.
A adesão à ANL foi espantosa: em apenas dois meses, houve a filiação de 50.000 pessoas somente na capital, contabilizando 1.600 comitês em todo o país.
A Intentona Comunista
Em razão do rápido crescimento da ANL, o Congresso Nacional aprovou a Lei de Segurança Nacional em abril de 1935, permitindo ao governo dissolver instituições que atentassem contra a segurança nacional e prender lideranças. No dia 11 de julho de 1935, o governo fechou os núcleos nacionais da ANL e reprimiu simpatizantes e liados.
A reação da ANL à medida repressiva do governo ficou conhecida como Intentona Comunista, cujo o líder, Luís Carlos Prestes, e comunistas estrangeiros, com o apoio dos ex-tenentes que integravam a ANL, prepararam uma ação militar contra o governo Vargas.
A ação de agentes infiltrados na ANL e o despreparo dos revoltosos causaram o fracasso do movimento e desencadearam uma onda de perseguição, prisão e deportação de seus integrantes, dentre eles a mulher de Luís Carlos Prestes, Olga Benário, que foi entregue à Gestapo de Hitler, acusada de judia e comunista. Olga Benário foi assassinada pelas tropas nazistas numa câmara de gás, no campo de concentração de Ravensbruck, na Alemanha.
A Intentona Comunista foi de agrada em Natal no dia 23 de novembro de 1935, em Recife e Olinda no dia 24 e no Rio de Janeiro no dia 27, sendo duramente bombardeados a Escola de Aviação e o 3o Regimento de Infantaria, até a sua rendição.
O país, a partir de então, passou a viver sob estado de sítio.
O Plano Cohen e o golpe de estado de 1937
Com a proximidade do final do mandato presidencial e pretendendo permanecer no poder, Vargas e seus ministros militares articularam um golpe de estado para que se pudesse dar continuidade ao projeto modernizador do país.
O ministro Francisco Campos ficou encarregado de elaborar, secretamente, uma nova constituição. Contando com o apoio de militares simpatizantes dos ideais fascistas, dos principais governadores estaduais e dos integralistas, foi criada a farsa do Plano Cohen, em que supostamente os comunistas estariam tramando tomar o poder.
Mediante a divulgação pela imprensa do Plano Cohen e o clima de temor criado pela ameaça de os comunistas tomarem o poder, o Congresso decretou “estado de guerra”, permitindo a Vargas adotar medidas de exceção.
Em 10 de novembro de 1937, Vargas decretava o Estado Novo e outorgava a nova constituição, previamente aprovada pelo governador de Minas, pelo Integralista Plínio Salgado e pelos ministros militares. O Congresso foi fechado e os políticos liberais, temerosos de seu destino, pediram exílio nas embaixadas.
O Estado Novo (1937-1945)
Pela nova Constituição outorgada, o presidente passaria a ter plenos poderes e poderia baixar decretos-leis, intervir nos governos estaduais, confirmando-os ou substituindo-os. As Assembleias Legislativas (Congresso, Assembleias Estaduais e Municipais) foram extintas. As liberdades individuais, apesar de constarem no texto constitucional, foram suspensas e os partidos políticos foram extintos.
Novos organismos foram criados:
DIP: Departamento de Imprensa e Propaganda, encarregado da propaganda oficial do governo e da censura.
DASP: Departamento Administrativo de Serviço Público, instalado em 1938, centralizou a reforma administrativa no setor do funcionalismo, com autonomia para elaborar o orçamento dos órgãos públicos. Sua importância era vital para a economia do país, dada a interdependência dos demais órgãos burocráticos encarregados de reformar a atividade educacional, sanitária e agrícola.
Acompanhando a tendência mundial da época, o Estado Novo produziu e implantou vasta legislação sobre os direitos trabalhistas.
A legislação sindical foi elaborada para patrões e empregados, enquadrando e regulamentando as relações entre capital (burguesia) e trabalho (operariado).
A economia brasileira no Estado Novo
Economicamente, Vargas prosseguia na linha intervencionista e nacionalista, sem, contudo, intervir no capital estrangeiro. A eclosão da Segunda Guerra Mundial (1939–1945) também foi benéfica para a economia do país.
A industrialização que se seguiu foi baseada na montagem de um parque industrial com indústrias de bens de capital e indústrias de base.
A dificuldade de abastecimento de produtos industrializados gerados pela guerra fez com que Vargas aproveitasse o momento e, jogando com os Estados Unidos e a Alemanha, procurou obter o máximo de vantagens econômicas do conflito democracia versus Eixo.
O governo norte-americano mobilizou-se contra a simpatia de Vargas pelo nazismo e pressionou o governo brasileiro o direito de construir uma base militar em Natal, ao mesmo tempo em que necessitava de matérias-primas brasileiras para o desenvolvimento de sua política nuclear (diamante, quartzo, manganês).
Em troca dessa “aliança”, o Brasil obteve facilidade de financiamento para a construção de uma usina siderúrgica (Companhia Siderúrgica Nacional de Volta Redonda), auxílio técnico e militar, além de condição favorável para vender café e borracha no mercado norte-americano. Essa aliança produziu dois fenômenos publicitários nos Estados Unidos: Carmem Miranda e o personagem “Zé Carioca” dos estúdios Disney.
O governo estruturou uma ampla rede para controlar e planejar a economia.
O fim da Era Vargas
A participação do Brasil na Segunda Guerra gerou internamente uma contradição: um país com uma estrutura política fascista lutando na guerra contra os países do Eixo (nazifascismo).
Levantaram-se contra o regime (e não contra Vargas, necessariamente) intelectuais, artistas, juristas, estudantes da UNE (União Nacional dos Estudantes, entidade criada durante o governo Vargas), políticos mineiros (Manifesto dos Mineiros) e militares (esses últimos, a sua base de sustentação).
A pressão externa por parte dos norte-americanos também constituiu um dos fatores da derrocada do regime varguista, principalmente porque Vargas havia adotado uma política nacionalista, obstando a entrada de produtos industrializados norte- americanos.
Vargas foi obrigado a ceder, convocando uma Assembleia Nacional Constituinte a promovendo a reorganização partidária.
O movimento “Queremista”
Funcionários públicos (interessados em manter seus cargos), sindicatos “pelegos” e comunistas (sob orientação de apoiarem os regimes que combatiam o fascismo) queriam a permanência de Vargas no poder até a conclusão da Constituinte, por isso lançaram o slogan “Queremos Getúlio”, movimento que ficou conhecido como “Queremismo”. Da união dessas forças derivou a formação do MUT, Movimento de Uni cação dos Trabalhadores, um dos braços do “Queremismo”.
Temerosos de que Vargas lançasse mão de um novo golpe, lembrando que ele já havia “rasgado” duas Constituições (a de 1891 e a de 1934), os militares empreenderam um golpe preventivo, depondo o Presidente e garantindo os trabalhos constituintes sem Vargas. O cargo da Presidência foi entregue ao presidente do Supremo Tribunal Federal, José Linhares, que realizou as eleições presidenciais em 2 de dezembro de 1945.
Bibliografia:
- BRANDI, Paulo. Vargas: da vida para a história. Rio de Janeiro: Zahar, 1985.
- IGLÉSIAS, Francisco. Trajetória política do Brasil (1500-1964). São Paulo: Companhia das Letras, 1995.
Por: Wilson Teixeira Moutinho
Veja também:
- Segundo Governo de Getúlio Vargas – 1951-1954
- Revolução de 1930
- Estado Novo
- Revolução Constitucionalista de 1932
- Populismo
- Criação da Petrobras
- Processo da Industrialização do Brasil